As últimas impressões são as que perduram. Ao desperdiçar três ocasiões flagrantes de golo só no período de descontos, ao virar um resultado negativo nos últimos vinte minutos, ao empolgar os adeptos com uma segunda parte muito bem conseguida, o Benfica sai desta primeira mão de alguma forma aliviado, e com a sensação de, ainda que minimamente, ter cumprido o seu dever.
Todavia, os jogos começam logo ao apito inicial do árbitro, e são compostos por duas partes. Devo confessar que não percebo suficientemente de futebol para entender porque motivo uma equipa joga tão bem após o intervalo, depois de jogar tão mal até aí e com isso quase comprometer a carreira europeia de toda uma temporada.
No final da primeira parte estava firmemente convencido que o problema era físico, e que o desgaste da última sequência de jogos estaria a fazer-se sentir. A frescura da equipa na ponta final do jogo faz cair pela base essa hipótese, pelo que sobra o plano mental. E, neste particular, há que confessar que o Benfica ainda está distante, por exemplo, do FC Porto.
É verdade que o Estugarda está em penúltimo lugar da Bundesliga. Mas a Bundesliga não é a Liga Sagres, e onde a diferença se fará sentir de forma mais pronunciada é justamente ao nível mais baixo das respectivas tabelas classificativas. Este Estugarda, pelo que mostrou na Luz, seria equipa para integrar os lugares europeus do nosso campeonato, o que vale por dizer que não se poderiam esperar grandes facilidades desta partida. Infelizmente, ao que parece, o Benfica entrou em campo de forma demasiado altiva, acreditando que, com suavidade e sem grande esforço, os golos acabariam por surgir. Com essa atitude algo sobranceira, quase deitou por terra todas as suas aspirações na prova, e veremos na próxima semana se ainda acordou a tempo. Com uma primeira parte ao nível da segunda, os encarnados teriam a eliminatória resolvida (3-0? 4-0?) e, então sim, poderiam descansar na Alemanha. Assim, espera-os uma noite de grande sofrimento, de intensa pressão, e de alto grau de exigência – e, esperam os adeptos, com final feliz.
Passaram algumas horas desde o fim do desafio, e ainda estou um pouco nervoso. Aqueles primeiros 45 minutos foram um pesadelo difícil de suportar, sobretudo para aqueles que, como eu, tanta esperança depositavam (e depositam) nesta competição.
Independentemente dos aspectos mentais, e posta de lado a hipótese de desgaste físico que acima mencionei, creio que houve, isso sim, um problema atlético do Benfica – ou pelo menos de parte significativa dos seus jogadores, em particular os argentinos – face a uma equipa tecnicamente mediana, mas com uma planta física muito apreciável. A pressão que o Benfica tem feito sobre os seus adversários no campeonato português, cortando-lhes todas as iniciativas logo na primeira fase de construção, virou-se aqui contra o feiticeiro, e às unidades mais criativas do onze encarnado não foi dado um milímetro durante todo o primeiro período, em larga medida face à diferença de pesos e alturas nos duelos individuais. Mesmo na melhor fase do Benfica, não foram os artistas a aparecer, mas sim a raça de Maxi Pereira (grande exibição!), a capacidade de choque de Javi Garcia (que pena aquele amarelo…), a generosidade e velocidade de Fábio Coentrão, e os centímetros de Óscar Cardozo (com o seu golo tornou-se o melhor marcador de sempre do clube na Taça Uefa/Liga Europa) – bem como a entrada de três elementos atleticamente fortes, como Kardec, Martins e Menezes, em substituição dos pesos plumas Sálvio, Aimar e Jara, o que demonstra que Jorge Jesus terá feito um raciocínio idêntico. Foi conseguindo disputar a dimensão física do jogo aos alemães que o Benfica encontrou as soluções para dar a volta aos acontecimentos.
Diga-se também, em nome da justiça, que não fosse um fantástico guarda-redes germânico, e não fosse um árbitro holandês, o resultado teria sido mais amplo. O que o Benfica fez na segunda parte chegaria, em condições normais, para marcar mais do que dois golos, e mesmo no final da primeira poderia (e deveria) ter, desde logo, empatado a partida. Na segunda parte, Ulreich abriu o livro, mostrando todos os atributos da fantástica escola alemã de guarda-redes. Na primeira, Eric Bramaar não quis ver uma falta sobre Fábio Coentrão, que poderia ter aberto a porta a uma recuperação mais precoce, e, consequentemente, mais completa.
Isto leva-me a falar da arbitragem, para dizer que há já alguns anos desconfio dos juízes holandeses. Desde um célebre Portugal-Holanda para o Mundial 2006, tenho reparado numa certa animosidade por parte dos árbitros daquele país contra as equipas portuguesas, vendo uma simulação em cada queda, vendo uma provocação em cada protesto. Já revi o lance de Fábio Coentrão na televisão, e parece-me penálti claro. Já em 2007 este mesmo árbitro escamoteara uma grande penalidade ao Benfica, então frente ao Espanhol de Barcelona (sobre Simão Sabrosa), a qual custou uma presença nas meias-finais da Taça UEFA. Espero não me voltar a lembrar do lance de Fábio com a mágoa com que ainda recordo o de Simão.
Para concluir direi que o Benfica não perdeu ainda o seu favoritismo na eliminatória. Afinal de contas basta-lhe um empate no terreno de um adversário que, não sendo tão frágil como alguns pensavam, também está longe de constituir um papão. Mas não posso esconder o meu lamento pelo desperdício (em parte por culpas próprias) da oportunidade de sentenciar desde já este combate.
Se for necessário aligeirar a preparação do jogo com o Sporting, pois que assim seja. Ficar já fora da Europa é que não será aceitável.