A derrota do Benfica em Alvalade põe um ponto final na luta pelo título, significando, como já aqui dissera, a consumação de um fracasso para a equipa de Jorge Jesus, sobretudo se não esquecermos as expectativas que lhe foram colocadas sobre os ombros no início da época, e a confortável vantagem de que chegou a usufruir, já depois de dobrada a primeira volta do Campeonato. Mesmo ganhando a Taça da Liga (o que ainda não é líquido), o Benfica já não se salvará do crivo de uma segunda temporada consecutiva muito aquém das legítimas ambições dos seus adeptos, e nada correspondente ao valor dos investimentos realizados pela sua direcção. A discussão acerca das razões que levaram a isto não deverá ser feita a quente, mas a breve trecho não poderá ser evitada, até porque é possível identificar muitos pontos comuns na forma como o Benfica perdeu a Taça de Portugal e a Liga Europa de 2010-11, e no modo como deitou para o lixo este Campeonato de 2011-12, que a dada altura chegou a parecer pousado em suas mãos.
Como uma fiel metáfora daquilo que foi o Campeonato no seu todo, o decisivo jogo de Alvalade pode também analisar-se em dois planos distintos. Um, o da arbitragem, que inegavelmente influenciou o resultado (e, já em momentos anteriores, o Campeonato), escamoteando um penálti claro aos encarnados quando ainda não estava completo o primeiro minuto, e voltando a pecar pela diferença de critérios em face de um lance discutível (entre Luisão e Wolfswinkel), e de um outro, a meu ver, mais flagrante (entre Izmailov e o mesmo Luisão), na área contrária. Outro plano de análise terá de nos remeter para a exibição medíocre da equipa do Benfica ao longo de toda a partida, deixando-se vulgarizar por um adversário estruturalmente inferior, coisa que se estranha atendendo a tudo aquilo que estava em causa nesta jornada. Uns optarão por centrar argumentos no primeiro aspecto, o da arbitragem. Outros privilegiarão o segundo, o do pouco futebol. Quanto a mim, não deixando de exprimir a revolta por mais uma actuação penalizadora de uma equipa de arbitragem, não deixando de me recordar de penáltis por marcar em Guimarães, em Coimbra, em Paços, nem do golo fora-de-jogo que acabou por fazer a diferença na globalidade da prova, não posso também deixar de dizer que o Benfica do último mês e meio se colocou a jeito do insucesso, e que também neste jogo nada fez para conseguir ser feliz. É de resto esse o balanço que agora mais me interessa fazer, pois é nele que o clube tem de concentrar atenções na hora de preparar as próximas épocas. Admito que, para o exterior, o discurso seja o da desculpabilização, e não faltam argumentos para ele. Mas, lá dentro, terá de prevalecer o da…responsabilização, pois se o Benfica tem ganho em Guimarães, em Coimbra e em Olhão, estaria agora calmamente no primeiro lugar.
Deste jogo, desta temporada, bem como da anterior, ressalta um dado que não me canso de lembrar, e que se prende com o perfil físico da equipa. A minha dúvida de leigo é se estes jogadores, dada a sua morfologia predominantemente franzina, estarão menos vocacionados para o futebol fisicamente exigente (esgotante?) que o seu treinador lhe pretende impor (mesmo em jogos menores, como alguns do mês de Janeiro), terminando as épocas de gatas, ou se é a própria gestão do treinador que leva a equipa ao esgotamento total, verificado nas fases decisivas destas duas últimas temporadas, com resultados dramáticos. No primeiro caso, há que reformular o plantel, e dotá-lo de três ou quatro gladiadores, com alto rendimento competitivo (sendo cáustico eu diria,
à Porto), mesmo se tecnicamente menos dotados que um Aimar, um Saviola, ou um Gaitan. No segundo caso, não haveria como contornar as responsabilidades de um treinador que, a ser assim, não teria condições para permanecer num clube com as ambições nacionais e internacionais do Benfica. Obviamente, não tenho dados, nem conhecimentos científicos, para emitir opiniões definitivas sobre a matéria. Apenas apelo a uma reflexão fria e aprofundada, que não pode, nem deve – em nome do benfiquismo – ser varrida para debaixo do tapete dos erros de arbitragem. Penáltis à parte, o Benfica não merece ganhar este campeonato, e vai perdê-lo, muito por culpa própria, para um dos mais débeis FC Portos das últimas décadas. Independentemente de outras opiniões, esse é o facto.
No meio da mediocridade generalizada, não posso deixar de salientar Artur, como o melhor homem em campo. Já noutras fases da temporada ele andou com a equipa ao colo. E agora, mais uma vez, não fora ele e o Benfica poderia ter saído humilhado de Alvalade. A sua actuação fez-me lembrar uma outra, de Preud’Homme, em jogo a que assisti no antigo estádio do Sporting, e que curiosamente também terminou com 1-0 a favor dos leões. Evocar o grande guarda-redes belga é o melhor elogio que posso hoje fazer ao número um encarnado.
Em sentido contrário, não consigo perceber o que se passa com Rodrigo. Uma lesão de seis meses, e até se perceberia a quebra de ritmo. Não foi o caso. Esteve uns dias sem treinar, e nesse curto período passou de um dos grandes craques do Campeonato português, a uma caricatura de um avançado de clube grande. Razões físicas, ou psicológicas? E agora até Cardozo parece eclipsar-se, acentuando ainda mais as debilidades de uma equipa em que os avançados, estranhamente, deixaram de marcar golos. Takuara não marca há 5 jogos, Nélson há 8, Rodrigo há 13 e Saviola há 21. A bola não tem chegado lá muitas vezes, mas…
Sobre Soares Dias já disse o essencial. Errou gravemente no primeiro lance (a única dúvida que me ficou, num primeiro momento, e depois dissipada pelas repetições televisivas, foi a de o lance ter ocorrido dentro ou fora da área, mas ele nem livre assinalou), e não manteve o critério até final da primeira parte. Não quero lançar suspeições sobre um árbitro que nem considero dos piores. Mas também não gostei de ver um juiz da Associação do Porto designado para um jogo tão importante como este, onde um título poderia ficar entregue a um clube dessa mesma Associação.
Para terminar queria manifestar, uma vez mais, a minha estranheza pela forma como o mundo sportinguista entende a rivalidade com o Benfica, bem reflectida nos festejos de uma vitória que não aqueceu nem arrefeceu o pobre campeonato do Sporting, e nas inflamadas declarações de populares à saída do estádio. Na verdade, não consigo perceber (estou a ser absolutamente sincero) porque motivo conseguem agregar tanto ódio a um adversário que, pelo menos em termos institucionais, nunca os hostiliza, e que nem sequer tem ganho títulos com frequência nas décadas mais recentes. No passado (anos sessenta, setenta) a coisa fazia sentido. Actualmente, a rivalidade lógica do futebol português é a que acontece entre Benfica e FC Porto, dois primeiros classificados, também, destes últimos campeonatos. É claro que a história pesa, e eu também não gosto do Sporting. Nunca esperaria que em Alvalade gostassem do Benfica. Mas…tanto ódio?!!?? Como? E, sobretudo, porquê?!? O que vê o sportinguista comum no Benfica? Inveja pela popularidade do clube da Luz? Pela sua maior dimensão? Pelo tratamento alegadamente preferencial da imprensa? Que culpa tem o Benfica disso? Sinceramente, mesmo depois de um ciclo de seis vitórias consecutivas (agora quebrado), tudo isto é algo que transcende a minha compreensão.
PS: A Taça da Liga não irá salvar a época, mas pode, e deve, servir para limitar os danos. É um troféu, pode ser uma conquista. Além do mais, é importante que a equipa não desmobilize, pois o segundo lugar no Campeonato está em causa, e é de importância crucial, quer em termos financeiros, quer em termos de preparação da próxima temporada.