Quando se aproxima o início de mais uma edição da Liga Portuguesa, VEDETA DA BOLA traz-lhe uma breve antevisão daquilo que poderá ser esta competição, designadamente no que à luta pelo título diz respeito.
Embora o Sporting de Braga se vá paulatinamente afirmando no panorama futebolístico nacional, a verdade é que os grandes candidatos ao título são os mesmos de sempre: F.C.Porto, Sporting e Benfica. Assim sendo, esta abordagem incidirá nessas equipas, até por serem aquelas que, graças a uma maior visibilidade, mais se permitem explorar.
Vamos então a isto:
F.C.PORTO
Com um orçamento que representa quase o dobro dos concorrentes directos, o F.C.Porto parte para esta época como campeão em título e com o quadro de jogadores praticamente inalterado. Não fosse a súbita mudança de treinador a duas semanas do início da competição, poder-se-ia dizer que se apresentava com amplo favoritismo para a renovação do título.
Todavia, a substituição de Co Adriaanse por Jesualdo Ferreira merece ser encarada de forma substancialmente diferente do que uma mera mudança de comando técnico. Esta alteração será também, inevitavelmente, uma mudança de conceitos, de princípios e de métodos, com uma amplitude que dificilmente evitará deixar algumas marcas. Um sucessor de Adriaanse, qualquer que ele fosse, nunca poderia constituir uma solução de continuidade, tais as especificidades evidenciadas pelo controverso técnico holandês. Quem, depois de variadíssimas experiências, coloca a equipa a jogar com três defesas e quatro avançados, quem dispensa Jorge Costa, Nuno Valente, César Peixoto, Diego, Hélder Postiga, Hugo Almeida, McCarthy, encosta Vítor Baía e sugere as aquisições de Sonkaya e Sektioui, não é, de todo, fácil de compreender, sobretudo se se torna campeão e vencedor da taça.
A primeira questão que se coloca ao F.C.Porto é pois a de saber até que ponto Jesualdo Ferreira será capaz de impor as suas ideias dispondo de um plantel que foi construído por Adriaanse, e feito a pensar na tipologia de jogo do holandês, nomeadamente se atentarmos ao sector defensivo, onde as opções não são de modo algum equiparáveis à abundância do meio campo para diante. Se essa operacionalização for efectuada com sucesso, teremos um Porto em condições de revalidar o título e de se apresentar em termos internacionais com uma envergadura que Adriaanse não lhe conseguiu dar. Mas o caminho não será fácil.
Não se vê por exemplo como Bosingwa e Marek Cech possam ser capazes de sustentar as faixas laterais sem qualquer alternativa durante toda a temporada, partindo do princípio que será recuperado um sistema com quatro defesas. O centro do ataque entregue exclusivamente a Adriano e Hélder Postiga também não oferece muitas garantias (a menos que Lisandro se afirme como ponta-de-lança) sobretudo em caso de lesões ou castigos - recorde-se que um dos motivos de queixa de Adriaanse foi justamente a sua insistência no compatriota Vanegoor of Hasselink, nunca satisfeita pela direcção portista. Não se vê quem possa emparceirar com Quaresma no flanco de ataque oposto (ou substitui-lo em caso de ausência forçada), nem que modelo possa articular na mesma equipa Lucho Gonzalez, Raul Meireles, Ibson, Anderson, Jorginho e Paulo Assunção (um losango ?). No centro da defesa, com as lesões de João Paulo e Pedro Emanuel, as opções estão reduzidas aos jovens Ricardo Costa, Pepe e Bruno Alves, o que parece manifestamente pouco para quem tem legítimas ambições de ir longe na Champions League, prova que ganhou há pouco mais de dois anos - equipa da qual, diga-se, já não resta um único elemento entre os titulares.
Portanto, um plantel ao qual bastaria um ponta-de-lança para apresentar um notável equilíbrio face à ideologia de Adriaanse, afigura-se-nos, mau grado o valor individual de muitas das suas peças, algo desarticulado se pensarmos nos sistemas de jogo que Jesulado Ferreira (como qualquer treinador “normal”) tem privilegiado na sua carreira, e que têm oscilado entre o 4-3-3 (sobretudo este) e o 4-4-2.
De qualquer modo a qualidade existe, há jogadores a despontar como grandes promessas, caso de Anderson, e outros que são certezas absolutas como as estrelas Quaresma e Lucho, ou Pepe, uma das revelações da época passada. Há também a hipótese, pouco provável, de Jesualdo manter ao longo da época o modelo herdado de Adriaanse (que teve tempo de estudar), e assim procurar traçar uma linha de continuidade capaz de garantir uma maior segurança competitiva.
Para já, o FCP tem motivos de satisfação, pois conquistou o primeiro troféu oficial da época: a Supertaça.
Resumindo temos:
PONTOS FORTES: Grande qualidade individual de alguns jogadores; Juventude e ambição na generalidade do plantel; Auto-estima reforçada com as conquistas do ano passado; Experiência do treinador, grande conhecedor do futebol português; Orçamento capaz de limar as arestas existentes no plantel já ou em Janeiro; Hábitos de vitória bem implantados; Meio campo com múltiplas soluções; Eficácia goleadora de Adriano; Magia de Ricardo Quaresma; Apenas Ricardo Costa e Lucho estiveram no Mundial, e pouco jogaram.
PONTOS FRACOS: Inoportuna substituição técnica; Provável necessidade de ruptura com o modelo anterior; Plantel desenhado por e para Adriaanse; Poucas opções na defesa, quer na zona central quer nas faixas; Falta de alternativa a Quaresma; Saídas de McCarthy e Hugo Almeida não devidamente supridas
ESTRELAS: Helton, Quaresma e Lucho Gonzalez
A SEGUIR COM ATENÇÃO: Anderson
EQUIPA TIPO: Helton, Bosingwa, Pepe, Ricardo Costa, Marek Cech, Paulo Assunção, Lucho Gonzalez, Anderson, Ricardo Quaresma, Adriano e Lisandro Lopez
GRAU DE FAVORITISMO: 35%
SPORTING
Se houvesse campeões na pré-época, o Sporting teria já assegurado o título.
Mantendo a estrutura da temporada anterior completamente inalterada – o mesmo técnico, o mesmo modelo de jogo e os mesmos jogadores -, o Sporting viu ainda nascer mais um conjunto de produtos das suas torrenciais escolas (como Miguel Veloso, Djaló ou Ronny), que garantem ao seu plantel um leque de opções maior e mais versátil que aquele com que conquistaram o segundo lugar e o acesso directo à Liga dos Campeões no último campeonato.
Com um 4-4-2 em losango já devidamente afinado, o Sporting, com uma equipa organizada, talentosa e bastante equilibrada, tem contudo em Liedson a sua unidade determinante, sem a qual todos os méritos encontrados na restante gestão do plantel não passariam de pura fantasia. O “levezinho” é claramente o melhor avançado a jogar em Portugal, e só por si garante a totalidade do caudal de jogo ofensivo dos leões, sendo capaz de pôr em sentido qualquer linha defensiva contrária.
Com Ricardo na baliza, o Sporting tem em Abel, Tonel, Anderson Polga e Marco Caneira, um quarteto defensivo sólido mas sem grandes opções de banco, sobretudo no sector central. No losango de meio-campo, a utilização do criativo quarteto da “cantera” Custódio, Carlos Martins (agora chamado por Scolari), João Moutinho e Nani é uma hipótese, complementada muito bem com as credíveis opções de João Alves, o uruguaio Paredes, o argentino Romagnoli, o chileno Tello e o sueco Farnerud, todos eles internacionais. O ataque será Liedson e mais um, que pode bem ser Djaló, o brasileiro Deivid ou o recém contratado Carlos Bueno. Há ainda o camaronês Douala, que vem de uma época muito apagada e dificilmente encontra o seu espaço no modelo de jogo preconizado por Paulo Bento.
Pode-se pois dizer que o Sporting, sem as indefinições dos seus rivais, com total estabilidade de processos e de meios, é neste momento a equipa que se encontra em melhor posição para enfrentar a Liga.
Resta saber se a juventude e inexperiência internacional da grande parte da equipa (e do treinador) não se fará sentir, nomeadamente na articulação entre a participação na Champions League e as provas nacionais, se Tonel e Polga não se lesionam, se Liedson não se constipa, se Carlos Martins (ou Romagnoli…ou mesmo Moutinho…) não se eclipsa novamente, e se uma maior competitividade no balneário não fará algum sangue ao longo de uma temporada em que alguns elementos poucas vezes terão oportunidade de jogar.
Seja como for, se tivesse de apostar em alguém, fria e objectivamente, escolheria o Sporting como principal favorito à conquista do título que lhe foge há já quatro anos.
PONTOS FORTES: Estabilidade resultante da manutenção de toda a estrutura; Liedson; Equilíbrio do plantel face ao modelo de jogo utilizado; Juventude e ambição da equipa; Grande personalidade do técnico; Modelo de jogo muito bem sistematizado; Meio campo fortíssimo com múltiplas opções; Muito entusiasmo dos adeptos em redor da equipa ; Praticamente imune ao desgaste do Mundial.
PONTOS FRACOS: Faltam opções de banco no centro da defesa; Falta de flanqueadores; Excessiva dependência de Liedson no ataque; Inexperiência de muitos jogadores do plantel; Possível excesso de confiança, se as coisas lhe começarem a correr bem; Eventual maior desgaste com um grupo fortíssimo na Liga dos Campeões.
ESTRELAS: Ricardo, Liedson e João Moutinho
A SEGUIR COM ATENÇÃO: Ronny e Djaló
EQUIPA TIPO: Ricardo, Abel, Tonel, Anderson Polga, Marco Caneira, Custódio, Carlos Martins, João Moutinho, Nani, Liedson e Deivid
GRAU DE FAVORITISMO: 40%
BENFICA
Apresentando-se com um plantel de qualidade em termos individuais – é quem dispõe de mais internacionais A, é a equipa mais experiente e fisicamente mais robusta da liga - o Benfica passa porém por uma fase de alguma indefinição em termos competitivos.
A novela em redor da saída ou não de Simão Sabrosa teve amplas consequências no trabalho da equipa, a começar pela arquitectura inicial do plantel e a terminar na mudança de sistema que Fernando Santos (recém chegado ao clube) foi obrigado a fazer a meio da pré-época, após uma série de maus resultados.
Tendo como certa a saída do capitão, o Benfica libertou Geovanni, impelindo Santos a estruturar um modelo de 4-4-2 em losango (semelhante ao do Sporting), onde não cabiam extremos de raiz (que deixavam assim de existir no plantel), e havia lugar para dois pontas-de-lança, o que levou à insistência em novo empréstimo de Miccoli e precipitou a contratação do mexicano Fonseca, quando já estavam na Luz Nuno Gomes, Mantorras e Marcel.
Os maus resultados – normais num período de adaptação, mas dificilmente digeridos pelos adeptos – e o presumível volte-face no caso Simão (para além da mais que provável saída de Karagounis, elemento crucial para fazer de interior no “quatro” de meio campo), parecem ter levado o técnico a alterar o programa, e a recuperar o 4-2-3-1 que os encarnados utilizavam desde os tempos de José António Camacho. Os resultados na pré-eliminatória da Champions League parecem ter sido o sinal definitivo de que o técnico necessitava para se decidir por que caminho enveredar.
Acontece que, para jogar desta forma, o Benfica necessita de mais um médio defensivo como opção a Petit e Katsouranis (podia ser… Manuel Fernandes), de um ala direito de qualidade para assumir a titularidade (podia ser… Geovanni) tendo, por outro lado, demasiados pontas-de-lança para quem pensa privilegiar a utilização de apenas um de cada vez na maioria dos jogos.
Há pois um desequilíbrio, à primeira vista insanável, de que o técnico é o menor responsável, mas que condiciona, veremos se definitivamente ou não, a expectativa do Benfica para a época que está à porta.
Tal como Jesualdo no F.C.Porto, Fernando Santos também se vê obrigado a uma difícil ginástica táctica para formar um grupo vencedor, o que não sendo impossível, poderá demorar ainda algum tempo, tempo esse já entretanto ganho pelo Sporting de Paulo Bento.
Para já, o Benfica tem para oferecer uma defesa seguríssima (uma das melhores da Europa na temporada passada, e de onde ninguém saiu), uma boa dupla de médios defensivos, um artista que, se a condição física ainda o permitir, será seguramente um dos destaques da liga (Rui Costa), e uma colecção de pontas-de-lança para todos os gostos. Ah… e Simão Sabrosa.
Tem também o mérito de, numa liga onde actuarão mais de duzentos estrangeiros, se ter apresentado na pré-eliminatória da Champions inicialmente com oito portugueses no onze inicial. À semelhança do F.C.Porto (vencedor da Supertaça), também já atingiu um dos objectivos da temporada: estar na elite da prova rainha do futebol europeu.
PONTOS FORTES: É, destacadamente, o plantel com maior número de internacionais A pelos seus países; É o plantel fisicamente mais alto e forte de entre os três grandes; Espinha dorsal constituída por jogadores de larga experiência; Grande identificação com a mística do clube de muitos dos principais jogadores (Luisão, Petit, Rui Costa, Nuno Gomes etc); Sector defensivo muito bem recheado, e quase insuperável quando inspirado; Boa dupla de médios defensivos; Pontas-de-lança em quantidade e razoável qualidade; Rui Costa extremamente motivado, com a camisola do seu coração finalmente vestida; A força da maior massa adepta do país que, se as coisas correrem bem de início, poderá ser determinante.
PONTOS FRACOS: Indecisão provocada pelo caso Simão; Instabilidade generalizada na construção do plantel (além de Simão, também Manuel Fernandes, Karagounis, Miguelito, Marcel, Karyaka etc); Alteração de toda a programação táctica planeada inicialmente; Treinador sem contacto directo com o futebol português nas últimas épocas; Falta de mais um médio defensivo como solução alternativa; Falta de um ala direito de qualidade e experiência; Excesso de pontas-de-lança para o sistema que agora se pretende utilizar; Algumas possíveis feridas de balneário abertas por Koeman e ainda não devidamente saradas; Desgaste acrescido do Mundial, onde teve sete jogadores presentes; Alguns resultados da pré-temporada algo desmotivadores.
ESTRELAS: Luisão, Rui Costa e Simão Sabrosa
A SEGUIR COM ATENÇÃO: Manu
EQUIPA TIPO: Quim, Nelson, Luisão, Anderson, Léo, Petit, Katsouranis, Rui Costa, Miccoli, Nuno Gomes e Simão Sabrosa.
GRAU DE FAVORITISMO: 25%
RESTANTES EQUIPAS
Sem conhecer em profundidade a forma como algumas delas se têm apresentado na pré-temporada, apenas poderei acrescentar que o Sporting de Braga é claramente o quarto melhor plantel da prova, o Boavista parece bastante enfraquecido, tal como Nacional e Vitória de Setúbal. Por outro lado Marítimo, Académica, U.Leiria e Estrela da Amadora poderão ser as surpresas da época.
A forma como o Belenenses reagirá a toda a indefinição jurídica acerca da sua participação poderá ser um obstáculo à sua performance, ainda que tenha excelentes jogadores e um treinador sagaz e experiente.
Aves, Beira-Mar, Paços de Ferreira e Naval, são incógnitas, mas nenhum deles deverá fugir da luta pela despromoção até às últimas jornadas, salvo se Mário Jardel (contratado pelo Beira-Mar) conseguir recuperar o fulgor que fez dele um dos maiores goleadores da Liga Portuguesa há uns anos atrás.