HUMILDADE

"Cumpriram-se recentemente 50 anos sobre a conquista da primeira Taça dos Campeões Europeus, momento que constitui, provavelmente, o ponto mais alto de toda a nossa história centenária.

Os relatos da altura recordam uma equipa com excelentes executantes, mas, sobretudo, com uma elevada dose de humildade. Ainda não havia Eusébio, e só com uma mistura perfeita de qualidade técnica, humildade, e capacidade de sofrimento, foi possível suplantar o poderosíssimo Barcelona - já então recheado de estrelas de renome mundial, e considerado o grande favorito dessa final.

Se recuarmos um pouco mais no tempo, veremos outra equipa de combate a triunfar extramuros. Falo do conjunto benfiquista que, em 1950, venceu a Taça Latina (competição que alguns querem agora menosprezar), arrecadando o primeiro troféu internacional da história do futebol luso. Foi com arte, engenho, mas sobretudo com muita humildade, que um clube então ainda pouco conhecido além-fronteiras, se superiorizou na prova europeia mais importante da altura. Por cá, vivia-se em plena época de “violinos”. Eram eles os grandes e famosos. Nós… apenas os outsiders, os “pés rapados” que, com arreganho, trabalho e luta, os conseguiríamos suplantar depois, tornando-nos então no maior e mais popular clube português.

A humildade está pois na génese dos nossos principais triunfos, e é parte integrante da matriz central da nossa identidade. Uma atitude humilde e lutadora, acompanhou sempre o crescimento do nosso clube, desde os tempos da Farmácia Franco até ao topo do mundo.

Decorridos muitos anos, e muitas vitórias, nem sempre temos sabido relevar esse passado. Do alto de uma gloriosa saga europeia, do alto dos muitos títulos nacionais, do elevadíssimo número de associados, e de um incomparável mediatismo, permitimos que o Benfica se tornasse, por vezes, um clube altivo e sobranceiro. E essa é, hoje, uma das nossas principais fraquezas.

Tenho abordado aqui, ao longo das últimas semanas, aspectos que, no meu modesto entendimento (e enquanto mero adepto de bancada), podem contribuir para que as próximas temporadas do futebol encarnado sejam substancialmente mais felizes do que aquela que terminou. Depois de falar da força física, e da força mental, creio que a humildade (a todos os níveis) deve também figurar no elenco.

O Benfica é o clube mais odiado do país. Não o é apenas nos recintos dos nossos principais rivais (FC Porto e Sporting, que competem entre si para ver quem mais nos detesta), mas também em quase todos os estádios que visita, seja em Braga, em Guimarães, em Setúbal, em Olhão ou em Leiria. Tratando-se de um clube que apenas foi campeão duas vezes nos últimos 18 anos, esta não é uma situação comum, sobretudo havendo quem tenha ganho muito mais títulos durante esse período, e não seja objecto da mesma antipatia. Haverá razões que se prendem com o mediatismo que sempre nos acompanha, mas muitos dos adeptos desses clubes são peremptórios quando nos acusam de arrogância, soberba, mania das grandezas, e outros epítetos similares. Independentemente das razões que os possam assistir, esta é uma situação que temos de saber reverter, e creio que um discurso de maior modéstia poderia ajudar bastante.

A paixão pelo futebol, e por um clube, não é coisa que se explique nas cátedras da racionalidade. É difícil exigir do adepto comum uma postura de total realismo e objectividade. Mas não há forma de encarnar a humildade de que necessitamos se não tivermos (todos) uma noção real daquilo que hoje somos, e daquilo que efectivamente valemos. O passado não ganha jogos, e o Benfica da actualidade, para crescer, não pode viver sentado à porta do seu extenso e cintilante salão de troféus. Há que perceber que, em termos futebolísticos (e é disso que aqui se fala), perdemos claramente a hegemonia interna, e que ninguém vai ficar parado à espera que – por direito divino - a reconquistemos. Há que perceber também que, no plano externo, não somos mais que um clube mediano, numa Europa onde outros têm conseguido, ainda assim, brilhar. Só partindo desta cristalina realidade, encontraremos a estrada que nos pode levar ao futuro de glórias que o nosso passado fez por merecer.

A humildade tem de começar em cada um de nós, benfiquistas, e estender-se até profissionais e dirigentes. Não podemos afirmar, no início de cada época, que vamos ganhar este mundo e o outro. Não podemos pensar que, só porque nos chamamos Benfica, a cada conquista corresponderá necessariamente um ciclo esmagador, como se os adversários não existissem. Não poderemos entrar em (nenhum) campo, convencidos de que as camisolas chegam para impor os resultados que desejamos, até porque somos aquele a quem todos querem ganhar.

A humildade tem de estar no discurso, e tem de estar na acção (de dirigentes, técnicos, jogadores e adeptos). É um fato que todos temos de vestir, e sem o qual não estaremos em condições de alguma vez fazer reviver as sagas vitoriosas que os primeiros parágrafos deste texto recordam. Sem humildade, não conseguiremos sequer beliscar a supremacia daqueles que, a bem ou a mal, tomaram o nosso lugar."
LF no jornal "O Benfica" de 24/06/2011

MENTALIDADE GANHADORA

"Na sequência dos textos das últimas semanas, que têm procurado identificar aspectos a melhorar no futebol do Benfica, fala-se hoje aqui de força mental, combatividade e agressividade competitiva - elementos que, afinal, definem uma verdadeira mentalidade de campeão.

Entenda-se por força mental, a aptidão para extrair todo o potencial de competências inerentes ao indivíduo ou ao grupo, independentemente dos contextos exteriores. Numa equipa de futebol, isto traduz-se na capacidade de jogar constantemente ao máximo que o potencial técnico-táctico dos jogadores permita, sem quebras causadas por factores anímicos, sem excessos de confiança nem medos, sem permeabilidade a qualquer tipo de pressão exógena, e com a saudável agressividade que se exige em todos (mesmo todos) os momentos de competição. Simplificando, trata-se de tornar cada jogo numa final, e cada momento desse jogo no momento de decisão dessa final, sejam quais forem as circunstâncias que o rodeiem.

Sei que a comparação não é simpática, mas se olharmos para o FC Porto, constatamos uma particular habilidade em lidar com todo o tipo de pressões e condicionalismos, quer os positivos (enfatizando-os e explorando-os ao máximo, nunca permitindo que resvalem para a sobranceria), quer os negativos (eliminando-os, ou revertendo-os a seu favor). O que daí resulta é uma equipa confiante, motivada e agressiva, capaz de render a top em qualquer campo, e em qualquer situação, durante um ano inteiro. Imagino que não seja tarefa fácil implementar tão forte mentalidade. Mas que ela significa meio caminho andado para a obtenção de títulos, não restarão muitas dúvidas.

No caso do nosso rival, o contexto geográfico e cultural ajuda bastante. Trata-se de um clube fundado sob uma bandeira regionalista, e que tem alimentado uma cultura de conflito, e de trincheira, que contribui para o manter em constante vigília. É dessa fonte que bebe o fanatismo dos seus adeptos, que, confundindo e misturando – deliberadamente -, o FC Porto com a (sua) cidade, e com a (sua) região, sentem derrotas e vitórias num plano diferente ao da mera paixão clubista, e reagem em consonância. Isso é habilmente transportado para o interior do grupo (com lavagens cerebrais intensivas, como contam antigos jogadores), e reflecte-se num balneário ferreamente determinado em vencer (e, particularmente, em vencer-nos), onde a disciplina e o recato não deixam de desempenhar um papel vital.

Transpor uma cultura deste tipo para o Benfica é bastante mais difícil. Somos um clube universalista e cosmopolita, nascemos e vivemos numa cidade que também o é, e o conflito não está no âmago da nossa matriz identitária. Os adeptos do Benfica não têm qualquer familiaridade política, cultural, regional ou religiosa a ligá-los entre si, olham para o futebol com paixão, mas sem rancores nem complexos paralelos, o que também lhes retira militância, realidade que escorre para a estrutura e para a equipa. Há pois que encontrar mecanismos capazes de dotar o nosso clube de equivalente vitamina motivacional, e aqui, creio que o próprio adversário, as suas vitórias, e a sua arrogância, podem ser um elemento a explorar melhor.

Por outro lado, é também necessário fomentar uma relação de grande cumplicidade entre jogadores e clube, cultivando exigências, mas também afectos. Por muito genial que seja a gestão, por criteriosas que sejam as escolhas, por melhores condições materiais de trabalho que existam, são os jogadores, dentro do campo, que transportam a mística, que marcam os golos, que obtêm os resultados, que nos dão as alegrias e tristezas, e que, em suma, determinam o sucesso ou o insucesso do clube.

Sendo o futebol uma espécie de representação da guerra - embora sem vítimas -, uma equipa forte terá de se assemelhar a um exército militar, onde a disciplina e o rigor não podem permitir hiatos, cedências ou excepções. O clube tem de estar acima de tudo e de todos, e a exigência tem de ser total e quotidiana. A pressão de trabalhar nos limites deve vir, contudo, acompanhada de uma cuidada protecção contra factores, externos ou internos, que possam de alguma forma tornar-se perturbadores. Jogadores infelizes, preocupados ou ansiosos, não poderão nunca explorar o seu potencial máximo, e é ao clube que cabe protegê-los.

Só com uma simbiose perfeita entre clube e profissionais ao seu serviço, só criando uma cultura de clã, que abra espaço a um forte sentimento de exigência individual e colectiva, e seja capaz de fazer concentrar todas as energias no combate aos adversários, poderemos ver os jogadores do Benfica a superarem-se, a comerem a relva (se necessário for), e a imporem a sua capacidade em qualquer relvado, em qualquer competição, em qualquer jogo, e em qualquer momento de cada jogo. Só deste modo será possível caminhar para um espírito de conquista que leve os nossos jogadores a alcançar ainda mais vitórias e títulos do que aquelas que o seu talento permita, construindo a sua e a nossa felicidade."
LF no Jornal "O Benfica" de 17/06/2011

CARAS NOVAS






Não conheço alguns dos reforços do Benfica. Não tenho grandes dúvidas que muitos deles serão emprestados (Leo Kanu, Melgarejo, André Almeida ou Tiago Terroso, por exemplo), e poucos entrarão de caras na equipa.

Vejamos os principais, um a um:


ARTUR MORAES (ex Sp.Braga) – É, como disse, aquele que me parece com mais condições para assumir a titularidade no imediato, sobretudo se Roberto acabar por sair (como penso que seria desejável). É experiente, está adaptado ao país, conhece o campeonato, e tem qualidade. Não será o guarda-redes perfeito (esses são Casillas ou Neuer), mas é um excelente guarda-redes, perfeitamente à altura da baliza do Benfica.


DANIEL WASS (ex Brondby) – Vi-o jogar apenas alguns minutos, durante o Euro sub-21, e não me impressionou muito. O Benfica tem boas recordações de jogadores nórdicos, o que favorece as expectativas, mas, neste caso, a inexperiência não deverá permitir uma afirmação imediata. Será, na melhor das hipóteses, um bom suplente para Maxi (coisa de que o plantel carece). Na pior, mais um para a lista de cedências.


NUNO COELHO (ex Académica) – Passou-me totalmente despercebido ao longo do campeonato, pelo que não será, certamente, uma estrela de primeiro plano. É português, e como tal deverá permanecer no grupo, mesmo ocupando uma posição já lotada. Tem escola (foi internacional nas camadas jovens), e diz que é benfiquista (o que, valendo o que valendo, sempre soa bem aos ouvidos). Deverá passar o ano no banco, ou na bancada, a ver Javi Garcia, e eventualmente Matic, jogarem.


MATIC (ex Vitesse) – Foi englobado no negócio David Luíz, numa altura em que pouco se sabia sobre as necessidades do plantel neste defeso. A sua posição natural será a de Javi Garcia, onde já havia Airton, e onde também haverá Nuno Coelho. Não sei até que ponto poderá adaptar-se a outro lugar (por exemplo ao lado direito). Tem uma estatura considerável, aspecto que considero determinante, e conhece o futebol europeu, o que significa uma mais rápida integração. Tenho alguma esperança que se possa afirmar, mas não o conheço suficientemente bem para ter certezas.


BRUNO CÉSAR (ex Corinthians) – De todos os reforços é, à excepção de Artur, o que melhor conheço, pois vi-o jogar várias vezes no Campeonato Paulista, através do PFC. É um criativo, um repentista, que denota capacidade de passe longo, e de remate. Parece-me um pouco pesado, e pouco disponível na hora de defender. Mas acredito que Jesus o faça crescer competitivamente. Temo, pelo contrário, que Aimar e Carlos Martins lhe tapem a posição natural, e não sei qual será o seu rendimento numa ala. Na pior das hipóteses poderá ser um novo Roger; na melhor (com muito trabalho táctico, físico e psicológico), uma aproximação a Deco.


ENZO PEREZ (ex Estudiantes) – Nunca o vi jogar, mas as referências são boas. Trata-se de um jogador seleccionável na poderosíssima equipa argentina, o que é, à partida, um atestado de qualidade. Espero uma espécie de Nico Gaitán, mas para o flanco direito, onde a mais que certa saída de Salvio deixa um buraco por preencher. Dado o seu perfil táctico, e dadas as carências da equipa, creio que poderá entrar directamente na titularidade.


RODRIGO MORA (ex Defensor Sporting) – Quer Cardozo permaneça (o que espero, e desejo), quer saia e seja contratado alguém para o seu lugar (Piatti, Funes Mori ou outro), este uruguaio - proveniente do antigo clube de Maxi Pereira - não deverá passar do banco. Nunca o vi jogar, mas pelas referências que tenho é mais uma alternativa a Weldon ou Kardec (ambos de saída), do que a qualquer um dos titulares. Ainda é jovem, e, à semelhança de Jara, terá tempo para se afirmar. Não há certeza de que fique no plantel.


NOLITO (ex Barcelona) – Ser dispensado do Barcelona não é, necessariamente, um mau sintoma. Trata-se da melhor equipa do mundo, onde, para além de Messi, já estão Villa, Pedro, Bojan (este também de saída) e mais alguns jovens promissores de grande qualidade. Creio que se trata de um extremo, mas como nunca o vi jogar, não conheço em pormenor as suas características, nem faço ideia se terá condições de se afirmar imediatamente como titular. Conseguir um jogador jovem do Barcelona, a custo zero, não deixa, no entanto, de parecer um óptimo negócio.

O MEU PLANTEL

Roberto, Oblak, Leo Kanu, Carole, Sidnei, Shaffer, Patric, Fábio Faria, Airton, Felipe Menezes, Miguel Rosa, Fernandez, Ruben Pinto, David Simão, Balboa, Elvis, Alípio, André Carvalhas, Yebda, Fellipe Bastos, Eder Luís, Urreta, André Almeida, Tiago Terroso, Rodrigo, Alan Kardec e mais uns quantos, seriam (ou continuariam) emprestados.

Fábio Coentrão seria vendido (25 milhões + Garay).

BYE-BYE!

Não entendo aqueles que continuam a ignorar que jogadores e treinadores são profissionais, que a sua vida, e a das suas famílias, está dependente do dinheiro que conseguirem ganhar no futebol, e que, obviamente, não podem perder-se muito em sentimentalismos, perante aquilo que lhes é essencial.

Uma coisa é sair de um Benfica para um FC Porto, de um Barcelona para um Real Madrid, ou vice-versa. Aí, concedo, há uma questão de respeito pelos adeptos, e pela própria dignidade. Desejar ir para um país estrangeiro à procura de melhores condições é, pelo contrário, perfeitamente natural, e só um idiota quereria ficar no FC Porto a ganhar 100 mil (se é que lá chegava), quando podia ganhar 400 mil (ou mais) noutro lugar.

Isto vale para Villas-Boas. Isto vale para Coentrão. Isto valeria para qualquer um de nós que se visse em semelhante situação.

De resto, vendo a parte que me toca, creio que este negócio é aquilo que o Benfica precisava para sair do sentimento depressivo em que tem vivido. Ao contrário do que eu próprio temia, com este inesperado golpe de estado portista, volta a ser possível sonhar alto. O super-FC Porto de Villas-Boas morreu. Tudo volta á estaca zero. De ultra-favorito ao título, o FC Porto passa, num dia, a mero candidato ao título. E vamos ver se segura Falcão, Moutinho, Rolando, Fernando…

Treinador para o FC Porto? Eu escolheria o Professor Neca. Mas, já que falo em Professores, e como Pinto da Costa aprecia bastante o Professor Carlos Queiroz, deixem-me sonhar, uns dias que seja, com essa possibilidade tão…azul.

E APESAR DE TUDO...

RESUMO: Benfica e FC Porto 9 troféus; Sporting 3 troféus; Oliveirense, CAB e Fonte Bastardo 1 troféu.

NEM DADO!

Pode até ter algum talento, mas as referências que tenho lido apontam para um péssimo profissional.

Ao que se sabe, gosta mais da noite do que de treinar, é um mau colega, chega constantemente atrasado aos compromissos, e inventa problemas para faltar a treinos. Até no cabelo é parecido com Balboa, e por alguma coisa nem o Hércules o pretende manter no plantel.

Ultimamente o Benfica tem tido o cuidado de contratar bons profissionais, e homens sérios. É esse o perfil da generalidade dos jogadores do seu plantel. Acredito que tal premissa não vá ser agora beliscada.

Garay sim. Drenthe, nunca!

ATÉ JÁ, NUNO!

Nuno Gomes tem o seu lugar reservado na história do Benfica. Foi um dos melhores goleadores de sempre do clube, foi capitão durante várias temporadas, foi um dos grandes ídolos dos adeptos, foi referência de balneário para muitos recém-chegados à Luz. Foi um jogador respeitado, porque sempre se soube dar ao respeito – pelo profissionalismo, pela dedicação, pelo fair-play demonstrado inúmeras vezes dentro e fora dos campos, e até pela simpatia e simplicidade pessoais que nunca deixou de cultivar.


Estando à beira de completar 35 anos, o treinador optou – no regular exercício das suas competências - por prescindir dos serviços do atleta. O Nuno Gomes de há cinco ou seis anos atrás teria lugar no plantel de qualquer grande equipa europeia. O Nuno Gomes de 2011-2012 seria, no entender de Jorge Jesus (que o conhece melhor que qualquer adepto, e que trabalha com ele diariamente), fundamentalmente um nome e um símbolo, que dificilmente se poderia tornar opção de relevo na luta pela titularidade.


Por muito que isso custe a aceitar àqueles que (como eu) mais o admiravam, o plantel do Benfica não pode absorver jogadores por aquilo que fizeram no passado, mas apenas por aquilo que se espera poderem vir a fazer no futuro. E não creio que alguém esteja melhor colocado do que Jorge Jesus para proceder a esse tipo de avaliação.


Tratando-se de quem se trata, o Benfica propôs-lhe (e bem) um lugar na sua estrutura profissional. Nuno decidiu não aceitar, privilegiando a possibilidade de jogar futebol durante mais uma época, previsivelmente num clube com menores exigências competitivas. Está no seu pleno direito.


Podemos discutir a opção de Jesus. Podemos também discutir se o assunto poderia, ou não, ter sido conduzido de forma mais célere. Mas não creio que se deva fazer um drama à volta disto. Recordo que Eusébio terminou a sua carreira no Beira-Mar, depois do Benfica ter recusado o seu regresso. Infelizmente para ele, e para nós, aquele já não era o seu tempo, e esse episódio não impediu que hoje o Pantera Negra tenha uma estátua em frente ao Estádio da Luz.


Nuno Gomes não foi Eusébio, mas nem por isso deixará de ter um lugar muito especial no afecto de todos os benfiquistas. Pela minha parte, só posso agradecer, enquanto adepto, tudo aquilo que o Nuno Gomes fez pelo Benfica, desejando-lhe as maiores felicidades para esta ponta final da sua carreira, e esperando que em breve possa voltar a fazer parte do clube que tão bem serviu como jogador, e que também ele aprendeu a amar.

INQUIETAÇÃO

Artur Morais, Daniel Wass, Leo Kanu, Enzo Perez, Nemanja Matic, Bruno César, Nuno Coelho, Nolito, Rodrigo Mora, Tiago Terroso, André Almeida, e ainda Urretavizcaya, Miguel Rosa, Nelson Oliveira, David Simão, Rodrigo, e possivelmente mais Garay, Dedé, Ansaldi, etc, etc.

Não será gente demais?

Quantos destes nomes terão efectivamente qualidade para se afirmar? Dois? Três?

Não seria preferível optar por duas ou três contratações cirúrgicas de reconhecida classe?

A LEI DO MAIS FORTE

"Identifiquei aqui, na passada semana, cinco aspectos específicos em que, na minha modesta opinião, o futebol do Benfica podia melhorar. O primeiro que referi, e, porventura, o mais notório de todos eles, prende-se com o perfil físico-atlético do plantel – que, quanto à sua robustez, fica claramente a dever ao do principal rival.

A situação não é nova, e já em 2008, num artigo intitulado “Gladiadores e Artesãos”, eu a trouxe a estas páginas. De facto, há muitos anos que vemos equipas portistas invariavelmente constituídas por verdadeiros “armários”, face a um Benfica de perfil quase sempre mais artístico, mais perfumado, mais requintado, mas também muito mais macio. Tal facto é, de resto, extensível às restantes modalidades, sendo patente uma superioridade física azul-e-branca em quase todas as principais frentes de batalha do desporto português, do Futebol ao Hóquei em Patins, do Andebol aos vários escalões de formação. Este crónico défice atlético, que salta à vista do mais desatento, explica, quanto a mim, muitos dos desaires sofridos ao longo dos anos ante o grande rival. No caso do Futebol (aqui em análise), acresce ainda que, num campeonato como o português, onde predominam equipas fechadas e agressivas, e se joga em campos pequenos e com relvados miseráveis, essa vertente física assume relevância acrescida, estabelecendo diferenças, e determinando campeões.

Há que dizer que, quando se fala de robustez física, não se fala apenas de jogadores com um metro e noventa e cinco de altura, ou noventa quilos de peso. Estamos também a falar de atletas cujo fulgor, cuja resistência, cuja agressividade, cuja combatividade, cuja força, os tornam mais poderosos em campo. Se também forem altos (e pelo menos metade da equipa convém que o seja), tanto melhor. Mas há jogadores fortes, resistentes e agressivos, que, não sendo gigantes em altura, são-no em combatividade. Temos, de resto, dois bons exemplos no plantel da época finda: Maxi Pereira e Fábio Coentrão.

Não é só no plano estritamente desportivo que a importância de uma equipa mais volumosa e mais viril se coloca. O mercado diz-nos que o talento se faz pagar melhor que o músculo, de onde inferimos que uma equipa eventualmente menos empolgante do ponto de vista plástico, mas mais robusta na hora de conquistar a bola, no momento de correr com ela, ou atrás dela, na forma de ocupar espaços em campo, ou de ganhar duelos individuais, poderia também ficar mais em conta para a nossa bolsa. Poderíamos pois, com ela, vencer em dois tabuleiros: o desportivo, e o económico. E se não encantássemos as plateias com arte (o que não é totalmente líquido, pois a beleza do futebol está, sobretudo, nas movimentações colectivas), encantaríamos com resultados, trazendo com eles maiores valorizações marginais a cada jogador. Eu, pela minha parte, não tenho dúvidas sobre aquilo que preferia.

Esta mudança de paradigma, que implica um olhar diferente sobre o próprio perfil do negócio – valorizando as individualidades a partir do todo, e evitando a compra avulsa de talento -, não pode ser efectuada de forma repentina, nem de ânimo leve. Temos grandes jogadores, que não correspondem ao perfil que aqui defendo (o que não diminui a minha admiração por eles), e cujo contributo não seria avisado desperdiçar. Existe uma base, que foi campeã há pouco mais de um ano, e é a partir dela que, pouco a pouco, devemos proceder aos acertos que se justifiquem. Não podemos perder-lhe totalmente o rasto, tendo sempre presente que foi de revolução em revolução que chegámos ao ponto em que estávamos quando, in-extremis, Manuel Vilarinho resgatou o clube do abismo. Seria suicidário entrarmos novamente numa espiral desse tipo, pelo que a estabilidade é também um valor a preservar na nossa casa.

Seria todavia interessante que, em decisões futuras, esta preocupação fosse tomada em conta, de modo a que cada jogo entre FC Porto e Benfica não tivesse de se assemelhar, no plano físico, uma repetida reedição do lendário combate entre David e Golias. É verdade que David ganhou uma vez, e foi essa excepção que deu corpo à lenda. Mas quantos Golias triunfantes não terá a história deixado cair para as suas notas de rodapé?

O futebol é um jogo, onde interessa ganhar. E é um desporto, em que os mais robustos, os mais rápidos, e os mais ágeis, levam franca, e decisiva, vantagem. É a correr e a lutar que se ganha, e para o conseguir, há que ser mais forte que o adversário. Um artista, bem integrado num colectivo forte, combativo e musculado, pode fazer a diferença. Uma equipa de artistas, sobretudo em Portugal, acabará sempre ingloriamente derrotada."

LF no Jornal "O Benfica" de 10/06/2011

UMA NOVELA OU UM NOVELO?

O Real Madrid quer Fábio Coentrão. Fábio Coentrão quer ir para o Real Madrid. O Benfica precisa do dinheiro da transferência.



À partida, o cenário não deveria trazer complicações, e mais milhão menos milhão, o jogador estaria em breve às ordens de Mourinho, com o Benfica a encaixar uma verba compensadora.



O que terá perturbado tudo isto, de modo a termos de assistir, entristecidos, a declarações precipitadas, processos disciplinares, e contra-comunicados?



Não sei, mas tenho as minhas suspeitas. Não gosto de Jorge Mendes, assim como não gosto (nada mesmo) de qualquer empresário de jogadores, agora pomposamente chamados de “agentes-Fifa”, e que mais não são do que aves de rapina num universo de espectáculo para o qual nada contribuem – não jogam, não treinam, não dirigem, não apoiam, mas enriquecem, e muito. São a face negra do futebol. Neste caso, por exemplo, ninguém me vai conseguir explicar qual a utilidade de um intermediário: Mourinho conhece o jogador, o jogador conhece Mourinho, Benfica e Real conhecem-se, e têm boas relações.



Não é a primeira vez que este tipo de novela sucede, nem decerto será a última. Enquanto existirem estes parasitas a viver do constante corrupio de transferências, clubes e jogadores não terão tranquilidade, e o futebol, mais do que um desporto, mais do que um jogo, mais do que um espectáculo, será um negócio, e dos escuros.



Neste caso particular, ao Fábio aconselharia calma, fazendo-lhe ver que o seu sonho não está em causa, que o Benfica apenas quer, de forma legítima, esticar a corda até ao valor da cláusula, e que qualquer declaração precipitada pode prejudicar a negociação, afectando também a imagem que construiu junto dos adeptos. Ao Benfica aconselharia habilidade e precaução no tratamento do caso, sabendo-se que o jogador, perante a possibilidade Real, jamais quererá ficará na Luz (ou seja, a transferência será, a bem ou a mal, consumada), sendo também de evitar uma atitude de hostilidade, quer para com um ídolo das bancadas (e Fábio Coentrão é, certamente, o jogador mais querido do plantel actual), quer para com um clube gigante, de expressão mundial, com o qual existem portas abertas que interessam preservar.




PS: Como qualquer português que se preze, tenho alguma simpatia pela Académica. Nunca percebi como mantinha à frente dos seus destinos uma figura sinistra e rasteira como José Eduardo Simões. Por maioria de razão, ainda estranho mais que o tenha agora reeleito. Há algo na fantástica cidade de Coimbra (juntamente com Évora e Guimarães, as melhores e mais belas do país), que eu não conheço, ou não compreendo.

VOLTAR A GANHAR

"Antes de ser um espectáculo, o futebol é um jogo, que vive de resultados. Quando se ganha, tudo está bem, quando se perde, tudo se transforma subitamente. Procuram-se então as razões para a derrota, mas essa busca nem sempre é conclusiva. Na verdade, uma importante fatia do êxito ou inêxito desportivo reside na natureza aleatória do próprio jogo, e procurar causas para certas derrotas (sobretudo quando ocorrem entre equipas da mesma igualha) é como tentar perceber porque não acertamos no Euromilhões. Havendo que vender jornais, e que subir audiências televisivas, somos frequentemente confrontados com análises que, a partir do resultado, constroem uma retórica de vazio, por vezes divertida, por vezes interessante, mas raramente esclarecedora. Estamos a falar de futebol, que não sendo propriamente uma ciência oculta, também não aceita prognósticos antes dos jogos – como uma voz sábia um dia nos ensinou.

Existe uma outra fatia deste bolo, que pode, essa sim, ajudar a explicar sucessos e fracassos com alguma objectividade. Arbitragens, lesões, ou o simples mérito dos adversários, são aspectos que interferem nas performances competitivas, desenhando-lhes o rosto, e traçando-lhes o rumo. Todos eles condicionaram, directa ou indirectamente, a temporada do Benfica: Benquerença em Guimarães e Xistra em Braga (não esquecendo muitos outros), lesões de Sálvio e Gaitán em altura de decisões (sem falar de Ruben Amorim), e, “last but not least”, um super-FC Porto (provavelmente o melhor do todos os tempos), marcaram inegavelmente o nosso destino, não permitindo que o sucesso de 2009-2010 pudesse ser repetido.

Nestes dois parágrafos está espremido muito do sumo das nossas frustrações. Creio, honestamente, que neles se situa a maior parte dos fundamentos para os pobres resultados conseguidos. Basta imaginarmos uma época com arbitragens perfeitas, sem lesões, com alguma sorte (por exemplo em bolas que bateram nos postes) e com o FC Porto do ano anterior, para percebermos o quanto poderíamos ter sido felizes com o mesmo plantel, com o mesmo treinador, e com a mesma metodologia de trabalho.

Azar, arbitragens, lesões e um opositor fortíssimo são, de facto, factores suficientes para explicar uma época de desilusões. Mas seria errado, e até contraproducente, concluir então que, para além deles, nada de mais ou de melhor poderíamos ter feito. Esconder a cabeça na areia não é política de campeões, e o Benfica – que melhorou bastante nos últimos anos - tem de saber aprender com os erros, aprendendo também a evitá-los, aumentando as possibilidades de sucesso, e reduzindo o campo de acção aos desígnios da fortuna. É justamente dessa componente interna (a única, afinal, em que podemos interferir) que nos devemos ocupar agora, de modo a que 2011-2012 possa ser uma temporada bastante mais feliz.

O FC Porto preparou-se convenientemente, no Verão passado, para enfrentar um grande e temível Benfica, acabando a época a ganhar-lhe em toda a linha. Cabe-nos a nós, agora, prepararmo-nos meticulosamente para o combate com um grande e temível FC Porto, de modo a que, dentro de poucos meses, lhe possamos ganhar também. O desafio não é fácil, mas um clube com a dimensão do nosso tem de saber estar à altura. A alternativa seria o assumir de um estatuto de inferioridade, que nenhum de nós está disposto a aceitar.

Numa análise necessariamente superficial, e com as limitações próprias de quem está do lado de fora, eu identificaria cinco itens, em face dos quais o futebol benfiquista pode, e deve, melhorar, aproximando-se da concorrência mais directa - que é como quem diz, daquele que foi o grande triunfador da temporada. Nesse sentido, haveria que:

1) Dotar a equipa de um perfil atlético bastante mais robusto;

2) Incutir-lhe agressividade, combatividade, e mentalidade ganhadora;

3) Manter humildade na acção e no discurso;

4) Aperfeiçoar os timings da definição do plantel;

5) Privilegiar a solidez defensiva.

Na minha modesta opinião, parecem-me ser estes os vectores em que, no campo e fora dele, o Benfica tem mais espaço para crescer competitivamente.

Alguns deles podem subdividir-se. Por exemplo, o ponto 1) prende-se, por um lado, com a política de aquisições, por outro, com o planeamento físico, e até, porventura, médico. O ponto 2) pode ter a ver com disciplina e rigor, com cultura, mas também com protecção, acompanhamento e afecto. O item 3) refere-se aos dirigentes, aos profissionais, mas também aos sócios e adeptos. E todos eles estão, de alguma forma, interrelacionados: uma equipa mais robusta, e com maior agressividade, garantirá maior solidez defensiva, um plantel definido atempadamente, pode facilitar a implementação de um registo ganhador, e assim sucessivamente.

Nas próximas semanas desenvolverei cada um destes temas."


LF no Jornal "O Benfica" de 3/06/2011

SERVIÇOS MÍNIMOS

Longe de deslumbrar os quase 50 mil que estiveram na Luz, a Selecção Nacional conseguiu a vitória de que necessitava para encarar de frente os últimos jogos da qualificação.

O jogo foi pouco interessante, a exibição descolorida, e Cristiano Ronaldo (naturalmente a grande atracção individual da partida), passou uma vez mais ao lado da “Equipa das Quinas”, acabando inclusivamente por ser assobiado pela impiedosa plateia. Em fim de época, com alguns jogadores a arrastarem-se penosamente pelo relvado, seria difícil pedir muito mais. Mas do craque do Real Madrid, e após uma das suas mais produtivas temporadas de sempre, esperava-se outro protagonismo. A carreira de Ronaldo na Selecção está a tornar-se um “case-study”, e os adeptos começam a perder a paciência perante uma ineficácia que é, de facto, difícil de explicar.

No plano oposto esteve João Moutinho, quanto a mim o melhor em campo. Foi dele que partiram os mais exuberantes momentos de futebol colectivo da equipa, e foram dele os equilíbrios que a dada altura deixaram a Noruega longe da área portuguesa. Realce também para Postiga, que, tratando-se um jogador pouco mais que mediano, parece ter o condão de aparecer nos grandes momentos.

Em termos globais, a Selecção fez o que lhe competia, mas com um registo exibicional mínimo, expondo-se a uma grande desilusão na ponta final do jogo (tenho a sensação que, com Carlos Queiroz no banco, aquele pontapé de canto no último minuto tinha dado o golo do empate). Exibições à parte, o mais importante era a vitória. Estes eram três pontos imprescindíveis, que não garantem absolutamente nada, mas sem os quais a presença no Euro 2012 se tornaria numa miragem.

Termino falando do público. É sociologicamente interessante observarmos a diferença entre o público de selecção, e o dos clubes. É outra coisa. É outro mundo. E traz vantagens e desvantagens. Entre as primeiras estão o clima de festa generalizado (comparável aos jogos de apresentação do Benfica), a quase total ausência de stress e carga dramática, e o fortíssimo contingente feminino nas bancadas – coisa que torna o espectáculo incomparavelmente mais belo e aprazível. As desvantagens são a falta dos cânticos das claques, e um ambiente, a espaços, um tanto adormecido; o parco conhecimento futebolístico de grande fatia dos adeptos (não falo só, nem particularmente, das mulheres), coisa que origina comentários absolutamente despropositados, e por vezes até irritantes; bem como o constante entra e sai, levanta e senta, que dura quase todo o jogo.

TUDO OU NADA

Não tenho tido muito tempo para escrever sobre a Selecção. Não significa isso que não esteja a cem por cento com ela (conto ir à Luz), no momento em que se pode decidir grande parte da qualificação para o Euro 2012.

AS NOSSAS CULPAS

"Quando o Benfica ganha, nós ganhámos. Quando o Benfica perde, eles perderam.

Esta parece ser a matriz de pensamento de muitos benfiquistas, que na hora da derrota se apressam a procurar culpados, esquecendo que o problema também pode passar por si próprios.

A época não foi feliz, e ninguém deve fugir às responsabilidades. O presidente foi o primeiro a assumi-las, num exercício de humildade que dignifica e engrandece o cargo que ocupa. Também o treinador já confessou ter errado em diversas situações ao longo da temporada, o que não lhe diminui a competência. Obviamente que os jogadores não escapam ao escrutínio, pois muitos deles não renderam aquilo que se esperava. Mas os adeptos também não podem colocar-se à margem do processo.

Se a força das bancadas foi uma das armas com que o Benfica conquistou o campeonato de 2009-2010, é preciso dizer que, nesta temporada, esse apoio nem sempre se fez notar.

Não consigo entender, por exemplo, como ficaram 8 mil bilhetes por vender numa meia-final europeia. Não consigo entender como, no jogo da Taça de Portugal com o FC Porto – que tanta importância viria a ter – apenas estavam presentes cerca de 35 mil espectadores. Não consigo entender como um clube com milhões de adeptos não consegue esgotar o estádio, uma só vez, em tantos meses de competição. A crise económica dói, mas não explica tudo.

Pior ainda foram as incompreensíveis manifestações de hostilidade para com os jogadores. A mais chocante terá ocorrido após a final da Taça da Liga. Mas outras houve, desde invasão de treinos, a esperas nos parques de estacionamento, que trouxeram para nossa casa o que de pior se tem visto nos rivais. Se somarmos os assobios que se dirigiram a Óscar Cardozo (marcando 100 golos, como é possível?), a César Peixoto, a Roberto, e a outros jogadores, teremos matéria suficiente para não deixar quase ninguém inocente.

Antes de atirarmos pedras, pensemos naquilo que fizemos, e naquilo que poderíamos ter feito. Talvez comece aí um Benfica mais forte."

LF no jornal "O Benfica" de 20/05/2011

10 RAZÕES PARA UM INÊXITO

"Face às expectativas criadas, face ao brilhantismo que a equipa, a dada altura, chegou a exibir, nada fazia prever o penoso final de época que o futebol benfiquista protagonizou, e que nos entristeceu profundamente.

Importa agora reflectir sobre o que contribuiu para tão ingrato desfecho, de modo a que os escombros desta temporada não venham condicionar também a próxima. Limitado, naturalmente, àquilo que se vê de fora, passo a identificar dez aspectos passíveis de explicar este insucesso:

1) Efeitos do Mundial - O Benfica foi a equipa portuguesa mais representada em África, e isso perturbou gravemente a preparação da época, que não contou com elementos preponderantes durante o primeiro mês de trabalho. Alguns desses jogadores (Cardozo, Luisão, Maxi) demoraram a regressar ao rendimento normal, condicionando desse modo os equilíbrios colectivos.

2) Estruturação do Plantel – Tem-nos sido difícil saber conciliar os timings de mercado (ajustados às ligas que se iniciam em Setembro), com os timings necessários à planificação de uma época vitoriosa. Ramires e Di Maria foram vendidos (e bem), mas o espaço que deixaram não estava devidamente acautelado. Sálvio veio muito tarde, e só em Dezembro se afirmou como titular, quando Campeonato e Liga dos Campeões eram já causas perdidas. Gaitán também demorou a adaptar-se a uma posição da qual não trazia rotinas.

3) Optimismo excessivo - Antes do início da época, não conseguimos evitar um discurso triunfalista, que além de alimentar a motivação dos adversários, fez crescer inutilmente as expectativas, com paralelismo no posterior desencanto dos adeptos. Subvalorizando o principal rival, o Benfica pareceu preparar-se para uma festa, quando tinha de se preparar para uma guerra.

4) Más arbitragens - Não me recordo de Campeonato tão adulterado pelas arbitragens quanto este. Seria fastidioso voltar a enumerar, um a um, todos os lances que nos lesaram. Mas até na Taça (golo em fora-de-jogo), e na Europa (golo do Sp.Braga após empurrão na área), fomos prejudicados, sem que a comunicação social o tenha relevado.

5) Permeabilidade defensiva - Com o Campeonato quase perdido, e fora da Champions, a venda de David Luíz foi, naquele contexto, uma boa decisão. Mas o certo é que, daí em diante, o Benfica revelou uma fragilidade defensiva que dificilmente se coadunaria com a obtenção de títulos. As responsabilidades não se esgotam, porém, no quarteto defensivo: meio-campo e ataque são sectores onde os golos dos adversários começam a ser construídos, e o Benfica desta época pressionou pouco, desposicionou-se muito, e defendeu globalmente mal.

6) Lesões – A praga começou com Cardozo, continuou com Ruben Amorim, terminou com Gaitán e Sálvio. Em fases decisivas da temporada, o Benfica viu-se subtraído de peças chave, com efeitos iniludíveis nas exibições e nos resultados. No lado direito, a dada altura, vimo-nos sem Sálvio, nem Amorim, nem mesmo Luís Filipe. Não há plantel que dê para tanto.

7) Falta de sorte - O futebol é um jogo, e, como tal, contempla uma componente aleatória que não podemos desprezar. As três bolas no poste nas meias-finais europeias, a carambola que deu o 3º golo ao FC Porto na Taça, as oportunidades desperdiçadas nas primeiras partidas do Campeonato (2ª parte com a Académica, 1ª parte na Choupana), foram momentos de infelicidade capazes de dizimar campeões.

8) Quebra física - Não entendo nada de preparação física, mas na fase mais crítica da temporada saltou à vista a dificuldade de certos jogadores em aguentar o ritmo e a intensidade dos jogos. Meses antes, os mesmos atletas revelavam enorme fulgor, e mantinham uma série recorde de vitórias consecutivas, abrilhantadas com exibições de luxo. Se a quebra se deveu a factores de treino, ou apenas a factores anímicos, é questão para especialistas. Interessa sobretudo que tal não se repita, pois as épocas terminam em Maio e não em Fevereiro.

9) Fragilidade anímica - A luta inglória por um Campeonato perdido acabou por minar a confiança dos atletas, e os efeitos notaram-se na Liga Europa e na Taça de Portugal. Nos momentos de decisão, esperava-se outro estofo mental da equipa, que não viria a conseguir libertar-se das suas angústias. Alguns adeptos também não ajudaram, pois quando se exigia apoio, responderam com mais pressão, com assobios, e até tentativas de agressão.

10) Super-FC Porto – Por muitas voltas que dêmos ao texto, a razão principal para não termos sido campeões, para não conquistarmos a Supertaça, e para não chegarmos á final da Taça, foi a soberba temporada que o FC Porto realizou. Omitir esta realidade seria esconder a cabeça na areia. Eles foram melhores, e ali, entre muitos aspectos negativos que conhecemos, há também muita coisa que podemos aprender. Desde logo que o futebol, antes de ser uma arte, é um desporto, onde os mais fortes, mais atléticos e mais vigorosos normalmente vencem."

LF no Jornal "O Benfica" de 27/05/2011

A MINHA HOMENAGEM