Caro jovem benfiquista.
Antes de mais, felicito-te por teres escolhido o clube certo.
Mas há algumas coisas que te quero dizer, quanto ao Benfica,
quanto à sua gestão, e genericamente quanto aquilo que é hoje o intrincado mundo
do futebol profissional. Para isso valho-me de quase 50 anos a ver desporto, a analisar o fenómeno, e a acompanhar as nossas equipas, e
também de um conhecimento profundo do clube por fora, enquanto sócio e adepto,
e também um pouco por dentro, enquanto colaborador não remunerado há mais de
uma década – designadamente do jornal “O Benfica”.
Quem, como tu, e como a generalidade dos jovens, se alimenta de
informação através da Internet, visita fóruns de opinião, e comenta em caixas
de blogues ou nas redes sociais, depara certamente com um movimento inusitado
de opiniões contrárias, por vezes devastadoramente contrárias, eu diria,
incompreensivelmente contrárias ao actual presidente, e à actual direcção – que,
só para começo de conversa, leva 5 títulos nacionais nos últimos 6 anos, o que é um paradoxo desde logo difícil de explicar.
Previno-te, antes de mais, que tal sentimento não corresponde ao pulsar
do benfiquismo profundo. E essa disparidade acontece essencialmente por dois
motivos:
1 1) Como imaginas, a Internet, e sobretudo num
assunto tão conflitual como o futebol, está carregada de manipulação,
designadamente através da utilização de perfis falsos a pretender fazer passar
opinião. E não te admires se um dia vieres a perceber que muitas das críticas
que lês aos dirigentes do Benfica são feitas na verdade por anti-benfiquistas
infiltrados e disfarçados, organizados ou não, com o intuito de desunir e
desagregar o nosso clube. Se eles até compram correspondência pirateada, mais
facilmente criam umas dezenas de perfis para inundar o “Ser Benfiquista”, o
Novo Geração Benfica” e outros fóruns com popularidade, para assim tentar desestabilizar
o Benfica. Cabe-nos a nós evitá-lo, mesmo que saibamos que nos irão chamar
cartilheiros ou avençados, mesmo que nunca tenhamos ganho um cêntimo do clube
como (aproveito para informar) é o meu caso;
2 2) Por outro lado, o Benfica é muito grande. Talvez
maior do que pensas. Provavelmente, como tantos outros, membro das claques ou
não, gritas no estádio que “o Benfica é
nosso, e há de ser”. É verdade que também é teu, mas não é só teu, nem é só
vosso. Também é meu, e dos milhões de benfiquistas espalhados pelo mundo. É de
todos. É, por exemplo, de milhares de sócios das Casas do Benfica de norte a
sul do país, e são esses, com as suas excursões, que enchem o estádio, pois com
o pessoal de Lisboa a Luz não passaria dos 30 mil. O Benfica é dos jovens, mas
também dos idosos, dos de meia-idade. Dos das cidades e dos das aldeias. De
Portugal e de outros pontos do mundo onde há portugueses. E até dos Palops. Isto
para dizer que se alguns grupos de jovens estão fartos do Vieira (muitos deles talvez
porque nunca conheceram outro), quem viveu mais anos, e tem memória do que foi
efectivamente o Benfica dos anos 70 e 80, mas também dos anos 90 e do início do
século, percebe melhor o trabalho realizado. Há uma fase da vida em que
pensamos que sabemos tudo. Essa energia é útil, mas com o tempo percebemos que
havia ainda muita coisa para aprender. Às vezes ainda vamos a tempo. Será com
certeza o teu caso.
Portanto há desde logo uma diferença substancial entre aquilo que são as
opiniões que encontras nas caixas de comentários, tweets, posts, blogs ou
fóruns de opinião, e aquilo que pensa a esmagadora maioria dos benfiquistas de
todo o país, de todo o mundo, de todas as idades. Esta maioria, não duvides,
sabiamente percebe e valoriza o trabalho realizado por Luís Filipe Vieira,
aprecia-o como um grande presidente – um dos melhores e mais ganhadores da
história do clube -, e votará nele de forma esmagadora no próximo ato
eleitoral. Fica a aposta.
E porquê, perguntarás tu.
Antes de mais porque, embora possa parecer, o mundo do futebol
profissional, e a gestão de clube gigantesco como é o Benfica, não é a mesma
coisa que jogar Football Manager em frente a um monitor. E com a idade, e a
correspondente vivência de factos, experiência de trabalhar em empresas,
conhecer organizações, etc, percebe-se muito melhor isso.
A gestão de um clube como o Benfica vai muito para além da contratação
do jogador A, a venda do B, ou mesmo da construção de um plantel de futebol –
sendo que isso também é importante. Da gestão de uma instituição de tão grande
dimensão, e com tantas áreas diversificadas, faz parte todo um universo de gestão
financeira, bancária, comercial, patrimonial, jurídica, cultural, comunicacional,
de recursos humanos que, numa área tão específica como o desporto, tão
escrutinada e mediatizada, com uma exigência tão elevada, não está ao alcance
de qualquer pessoa, e onde a experiência vale 80% e o sangue frio os restantes
20%. Vê o caso do Sporting, onde no passado alguns gestores de nomeada em
outros sectores de actividade se afundaram numa incapacidade total para lidar com
o fenómeno futebolístico (José Eduardo Bettencourt, José Roquette, Filipe Soares Franco
etc). E nem falo destes últimos anos, onde um grupo de jovens (uns
verdadeiramente delinquentes, mas outros apenas imaturos), com o alto
patrocínio de um presidente-adepto, quase destruiu o clube. Não é isso que
queremos, pois não?
Só no âmbito desportivo, o Benfica tem dezenas de modalidades e
equipas de competição. Cada vez mais, diga-se. Por exemplo, no desporto
feminino temos crescido de ano para ano, e isso também é trabalho desta
direcção. Mas o Benfica tem também centenas de funcionários, desde quem faz a
contabilidade, a quem trata da relva, passando por departamentos médicos,
jurídicos, de prospecção, e acompanhamento ao jogador, da área de comunicação, de
vendas, de marketing, bilhética, sócios, do Museu, da Fundação etc, etc. Ora em todas essas áreas
o Benfica tem crescido imenso, tem-se profissionalizado, sendo um exemplo de
grande sucesso no panorama desportivo português, e até europeu, sobretudo tendo
em conta o que éramos em 2001. Nem vale a pena falar de infraestruturas, pois
não?
Mas não te maço mais com isto, pois tu queres mesmo saber é de
futebol. Vamos então ao futebol.
Quando te queixas do Benfica vender os seus principais jogadores,
talvez ainda não te tenhas dado conta, mas o modelo de negócio é esse mesmo:
vender e voltar a formar, para voltar a vender. Não há alternativa, a não ser
que sejas multimilionário e queiras doar a tua fortuna ao clube. E precisava
mesmo de ser de muitas centenas ou milhares de milhões…
Nós estamos em Portugal, país periférico cujo campeonato ninguém vê a
não ser os próprios portugueses. Não temos as receitas televisivas e
publicitárias do futebol inglês, ou espanhol. E quando existe uma proposta de
30, 40 ou 50 milhões por um jogador (que no mês seguinte até pode lesionar-se e
terminar a carreira), não podemos, nem devemos recusar. Recusar seria, isso
sim, gestão danosa. Já nem falo nos 120 milhões de João Félix, que foram seguramente
dos melhores negócios da história do clube. O dinheiro não cai do céu, e não
poderíamos manter toda a “máquina” a funcionar sem essas receitas. Mas há mais.
Os jogadores profissionais são pessoas. Não são entidades virtuais
como na PES ou no FM. Têm aspirações, querem ganhar o máximo de dinheiro
possível, até porque a carreira é curta, e as oportunidades por vezes não
surgem uma segunda vez. Não tenhas dúvidas de que todos os jovens jogadores
formados no clube, de quem tanto gostas, querem é jogar em Inglaterra, Espanha
ou Itália, pois é onde se ganha mais. São profissionais, e por muito
benfiquistas que sejam (e alguns talvez nem o sejam), querem antes de mais o
seu bem-estar e o das suas famílias. Se fosses jogador profissional também
pensarias como eles, e aos trinta e tal anos logo voltavas tranquilamente para
o teu lugar cativo a torcer pela equipa.
Os salários oferecidos por clubes do “primeiro mundo”, digamos assim,
é francamente superior ao que o Benfica pode pagar. E a pressão deles, das
famílias e dos empresários para sair não deixa margem para qualquer
resistência. Até porque a saúde psicológica do plantel também passa por
respeitar as ambições dos atletas, e deixar que saibam que, no momento certo, o
clube não lhes vai cortar as pernas. Caso contrário irão pressionar para sair
ainda mais cedo. Além de que não podes inflacionar um ou outro salário, e
esperar que o restante plantel se mantenha feliz e motivado a ganhar menos. Há
contratos a cumprir, e o equilíbrio não é fácil de obter. O Benfica, o
presidente do Benfica, tem de saber gerir todas essas expectativas, todas essas
individualidades, de forma a que o balneário não se torne problemático. E os
timings são muitas vezes os timings do mercado, que infelizmente o Benfica não
pode, por si só, condicionar.
Neste contexto, e ao contrário do que lês por aí, a parceria com Jorge
Mendes tem sido essencial. Quem, se não ele, poderia colocar o Félix por 120
milhões (que hoje provavelmente já não valeria metade…)? Ou encontrar soluções
espectaculares para jogadores que não renderam como o RDT? O dinheiro que ele tem dado a ganhar ao clube,
e que nos permite manter uma situação financeira sólida e invejável (ao
contrário dos rivais), é algo que só temos de valorizar, e até agradecer –
embora ele não o faça, obviamente, por caridade. Achas que sem essa parceria os
jogadores se mantinham todos no Benfica? Estás enganado. Saíam era por muito
menos dinheiro, sob pressão, eventualmente alguns deles em litígio, e em vez de
teres um problema (substituir uma ou outra peça) criavas vários (desportivos,
institucionais, financeiros).
Ter um parceiro como Jorge Mendes é precioso no futebol de hoje – que,
queiras ou não, não é mais, nem vai ser nunca mais, o dos anos sessenta ou
setenta, que tu idealizas, mas na verdade também não conheceste, e na verdade
não era assim tão perfeito. Por exemplo a nível de exigência profissional (de
jogadores a técnicos e dirigentes) estava a anos-luz do de hoje. Ninguém mais do
que Jorge Mendes quer ver os seus jogadores valorizarem, pois isso é lucro para
ele. Ou seja, estamos do mesmo lado.
Mas isto leva-nos à questão dos empresários em geral. Assim como as
respectivas comissões, eles hoje fazem parte do futebol, nem todos se movimentam
tão habilmente como Mendes, e nem todos são honestos (quase poderíamos formular
a frase ao contrário, mas isso também não interessa para o caso). Gerir um
clube como o Benfica é também ter de lidar com agentes, por exemplo, da América
Latina, ou dos países da Europa de leste, muitas vezes já para além dos limites
da máfia organizada. É ter de pagar comissões para manter interesses. É
conhecer todo um mundo do qual podemos não gostar, mas que existe. Não é
qualquer presidente que está preparado para o fazer, que tem a experiência
necessária para o fazer, e que o consegue fazer com o sucesso desportivo que o
Benfica tem tido. Vieira anda no futebol há muitos anos, está preparado para o
fenómeno, conhece-o bem, e não sei de mais nenhum benfiquista que esteja nas
mesmas condições. É uma completa utopia pensar que uma qualquer figura do
benfiquismo, só por ser benfiquista, só por ser honesto, seria capaz de se
movimentar num meio com tantas especificidades.
Os negócios do mundo do futebol são, antes de mais, isso mesmo:
negócios. Sabes, por exemplo, que por vezes é necessário adquirir um jogador
que desportivamente não interessa para garantir um negócio futuro, ou saldar um negócio
passado? Ou como pagamento de uma comissão? Ou até para jogar com os pagamentos em prestações e ganhar dinheiro? Ou, porque não dizê-lo abertamente, dar dinheiro a ganhar a parceiros que podem ser importantes no futuro?
Por vezes também é necessário comprar este ou aquele jogador porque
convém criar boa relação institucional com este ou aquele clube, para evitar influências nefastas e/ou excessivas de clubes rivais, para abrir
portas neste ou naquele mercado, e por variadíssimos motivos que estão para
além das estritas necessidades do plantel – mas que não deixam de ser do interesse do clube.
E por todas estas razões, também nem sempre é possível conseguir o jogador que
se pretende – o qual até pode nem querer vir para Portugal, não querer ir para
o Benfica, do qual o empresário pode ter uma má relação com o clube, exigir
maior comissão que um outro, isto sem falar naturalmente nas exigências salariais
e no preço do passe.
É tudo muito complexo. Muito mais complexo do que parece à primeira
vista. Cada caso é um caso e envolve várias pessoas, com interesses próprios e
por vezes contraditórios, desde logo o próprio atleta, a família, o seu
empresário, os dirigentes do clube de origem ou destino, etc. E não é para
qualquer um. Nem deixa muita margem para condenarmos situações absolutamente
pontuais como a compra ou a venda de um jogador que correu menos bem.
O que é certo é que temos sido campeões, e em seis anos fomos cinco vezes ao
Marquês. Só no futebol profissional conquistámos 14 troféus nos últimos sete anos,
mais do que todas as restantes equipas portuguesas.
Parece fácil. Mas exige muito trabalho. E muito rigor. Sabes que no
Benfica todos os atletas são monitorizados ao segundo, dentro e fora das
instalações do clube, através de pulseiras específicas? Sabes que vivem muitos
deles em condomínios comuns, o que envolve as famílias e contribui para o
espírito colectivo? Sabes as restrições alimentares que têm, até mesmo de férias? Sabes que há funcionários até para lhes tratar dos cães e
gatos? Há muito trabalho envolvido para criar uma estrutura assim, mas o adepto
comum nem sempre se apercebe desses aspectos, e pensa que só se ganha ou perde
jogos por uma substituição ou por uma contratação. Como no Football Manager,
não é? Mas é tudo tãããão diferente…
Na verdade, em todos os factores críticos de sucesso, e no contexto
português, o Benfica está muito à frente dos rivais. E quem fez tudo isso? Tudo
isso apareceu por acaso?
Criticar Luís Filipe Vieira?? É verdade que cometeu erros, como
qualquer um de nós comete nos seus trabalhos e nas suas vidas. Peca por vezes
na comunicação, ao elevar demasiado as expectativas dos adeptos. Não deveria
falar em Benfica Europeu, pois no contexto actual isso é claramente prematuro. Por
vezes é levado pelo entusiasmo. Mas o balanço é extraordinário. Além de que é
um dirigente com respeito pelos adversários, por jogadores, treinadores,
funcionários, e cuja liderança toda a gente no clube aceita e segue – o que,
talvez não saibas, mas é importantíssimo para se ter sucesso a liderar qualquer
organização. Só isso, essa capacidade de conduzir uma instituição tão grande,
já não seria fácil de encontrar por aí. Fazê-lo com vitórias e com crescimento
a todos os níveis, é obra.
Não está, obviamente, imune à critica. É salutar haver exigência. Mas o que se lê por aí é um total exagero, e completamente desfasado da realidade.
Porque será que a comunicação do FC Porto o ataca de forma tão
persistente? Reparaste que não falam do treinador, nem dos jogadores, nem de
outros dirigentes. Só o atacam a ele, com todas as forças que têm. Eles sabem que
um Benfica sem Vieira seria um Benfica muito fragilizado, provavelmente
desorganizado, provavelmente com lutas internas pela liderança como vemos nos
vizinhos do lado.
Queres embarcar nessa onda? Queres contribuir para esse objectivo? Ou defender o Benfica e quem o representa, sem prejuízo de, no momento próprio, voltar a fazer a avaliação?
É tudo isto que um adepto com 50 anos percebe um pouco melhor do que
um de 20 – que por definição é impaciente e aventureiro, quer este mundo e o
outro, e para já. Além de, como disse no início, não se lembrar do que era o
clube em 2001, não saber o que era o futebol antigo (e romantizá-lo
excessivamente) e esquecer que dos anos oitenta para trás, em Portugal,
praticamente não havia FC Porto, e o único rival era o...Sporting.
Espero ter conseguido elucidar-te sobre algumas coisas. Não sou dono
da razão, mas já vivi o benfiquismo suficiente para poder falar do clube com
alguma autoridade moral. Nunca falo da minha vida privada, mas posso dizer-te que também tenho alguma experiência em gestão de equipas, em conhecimento de organizações de grande dimensão, e isso também me ajuda a ver toda a floresta e não apenas uma folha de uma árvore.
Estou certo de que vais pensar melhor quando, daqui em diante, entrares
numa qualquer caixa de comentários para destilar antipatia pelo nosso presidente - máximo representante do clube, e eleito por uma maioria esmagadora de votos.
Saudações Benfiquistas
LF