Nada me move contra Cristiano Ronaldo.
Admirei-o como jogador, quando era o melhor (ou, pelo menos, um dos
dois melhores) do mundo. Como português, gostava que marcasse golos, quer no
Manchester, quer no Real, quer mesmo na Juventus. Na Selecção Nacional, até
haver otávios, era um dos meus. E em locais sem grande expressão futebolística como
a China, a índia, ou os Estados Unidos, pude comprovar in loco a sua enorme popularidade
enquanto português mais conhecido de sempre. Foram, de resto, várias as
situações em que, no estrangeiro, ao dizer de onde era, logo vinha o nome
de Cristiano Ronaldo à baila. E quando, algumas vezes, em jeito de
brincadeira/provocação me perguntavam de seguida se o melhor era Ronaldo ou
Messi, invariavelmente respondia, num assomo patriótico, Ronaldo, of course.
Obviamente não conheço CR7 pessoalmente, nunca falei com ele, e tenho
o maior respeito por alguém que veio de meios extremamente humildes e chegou ao
topo do mundo. Tolero-lhe alguns comportamentos devido a essa trajectória, na
qual, na verdade, poucos mortais se podem colocar e garantir que teriam esta ou
aquela atitude. Honestamente, não sei como seria eu próprio se tivesse nascido naquele contexto e hoje fosse dono de uma das maiores fortunas do país. Chamar-lhe
arrogante ou vaidoso é, por isso, extemporâneo, e talvez até injusto.
Dito isto, também é preciso dizer que o seu tempo já lá vai. E que é
pena que o próprio pareça ser o único a não o perceber. É sintomático o que se pode ver no gráfico abaixo, com os seus golos por temporada. Foi lamentável, e
degradante, o espectáculo de pré-epoca, em que diversos clubes europeus lhe
fecharam a porta na cara (coisa que ele, seguramente, não estaria à espera). A
verdade é que na Selecção, como nos clubes, Ronaldo tornou-se mais problema do que
solução, ao não entender a sua actual medida, condicionando, assim, toda a
estratégia das equipas. Aceitasse de bom grado ficar no banco e saltar aos oitenta minutos para resolver alguns jogos mais complicados (Ibrahimovic, no Milan, por exemplo), e ainda seria útil.
Acontece que Ronaldo não aceita, nem entende essa condição. Acha que está em
2014, e que ainda é o maior. Isso torna-se complicado para qualquer treinador –
menos para Fernando Santos, que manda menos do que ele na equipa nacional, e assim a vai submetendo aos caprichos da sua estrela cadente.
Fora dos relvados, tenho também de lamentar que, alguém com a sua
dimensão planetária, com a sua idade, com acesso aos mais sofisticados meios de todo o mundo, e que
é capaz de fazer cair a pique as acções de uma marca de bebidas só por afastar o copo numa conferência de imprensa, não tenha uma intervenção social mais
activa. Na verdade, nunca lhe ouvi opinião sobre assunto nenhum. Podendo ser importante, limita-se ostensivamente a ser mediático. Exibe joias, penteados e carros, como um
puto ignorante e fútil de 19 anos, e fica-se por aí, parecendo não ter mais nada dentro daquela cabeça. Lamento,
pois, que o português mais conhecido de todos os tempos seja, objectivamente, um
imbecil – no sentido, vá lá, menos agressivo da palavra.
Com o andar dos anos, a Selecção Nacional tornou-se a selecção de CR7. Mais recentemente também a de Otávio e a de convocatórias irritantes quase ao nível da provocação. Não só para benfiquista (veja-se a teimosia de não convocar
qualquer jogador do Sporting num lote de 26, onde podiam caber Pote ou Gonçalo Inácio, por exemplo). Já há muito que era a selecção da
Nike e de Jorge Mendes. É talvez a selecção de todos menos dos verdadeiros
adeptos de futebol que, como eu, acham que se está a desperdiçar uma geração
fabulosa de jogadores lusos em nome de caprichos e interesses nem sempre claros, e de um culto a um rei que, salvo seja, já vai nu.
Fui adepto da Selecção Nacional desde criança. Por vezes quase tanto
como do Benfica. A pouco e pouco, e acentuadamente desde 2016, fui deixando de
sentir essa segunda camisola. Sendo uma representação do meu país, jamais
torcerei para que perca. Mas fico-me por aí.
Com os bilhetes oferecidos no Continente, e com o apoio dos Super
Dragões, também não precisam de mim, nem de adeptos como eu. Ainda bem. Tira-me peso da consciência.
O que tem isto a ver com Ronaldo? Talvez a correlação seja sobretudo simbólica. Tornaram-se farinha de um mesmo saco, que também está cheio de FPF, Nike, Gestifute, otávios, proenças, arbitragens etc, tudo palavras enjoativas, que, directa ou indirectamente, afastam milhares de adeptos da equipa que deixou de ser de todos nós.
Não deixo de lamentar que, para mim, a Selecção Nacional, tal como Ronaldo,
comece a parecer coisa do passado.