Antes de entrar no jogo em si,
devo confessar que me doeu substancialmente mais este empate do que a goleada de Atenas. Uma oportunidade perdida de atingir a liderança, uma vantagem sobre os rivais desbaratada - tudo apenas devido a um golo fortuito sofrido nos descontos de um jogo em casa contra um adversário sofrível - é algo demasiado duro para se aceitar com tranquilidade e bonomia. Em momentos como o daquele fatídico minuto apetece estar em todo o lado menos no estádio, e questiono-me como este desporto, que tanto nos apaixona, pode por vezes vestir uma pele de tamanha crueldade perante quem tanto a ele se dedica. Foi, sem dúvida, para mim, enquanto adepto do Benfica,
o momento mais difícil desta temporada até agora. Foi também a primeira vez que vi o meu filho com lágrimas nos olhos após um jogo, ele que semana a semana tanto se entretém a copiar a classificação dos jornais, e não se lembra de ter visto alguma vez o Benfica na frente.
Deixando de lado este estado de alma – sobre o qual tinha de desabafar -, queria focar três aspectos relativos a esta noite.
Em primeiro lugar, a profunda desilusão que constituiu a massa adepta do Benfica.
É inaceitável como num jogo em que o clube podia atingir a liderança da liga pela primeira vez em três anos, e na sequência de uma goleada injusta e penalizadora sofrida na UEFA, quando a equipa mais necessitava de calor humano à sua volta, o Estádio da Luz tenha registado a mais baixa afluência de público da temporada (pouco mais de 25 mil pessoas). Pior que isso, muitos dos que lá estiveram, pouco mais fizeram do que intranquilizar os jogadores, ora com protestos, ora com assobios (sobretudo na primeira parte), fazendo com que o esperado “Inferno da Luz” se transformasse, uma vez mais, num paraíso para os adversários.
Para os que faltaram à chamada, para os que nenhum apoio deram à equipa num momento – quem sabe – chave da época, o golo de Anderson aos 91 minutos foi a resposta merecida. Quem espera pelas vitórias mais reluzentes para dar ânimo a uma equipa que agora tanto dele precisa, deve ser também responsabilizado pelas más prestações desportivas do Benfica nos últimos anos, pois com adeptos destes é difícil – e nem sei se valerá a pena - fazer melhor. Como aqui já disse, não adianta nada dizer à boca cheia que se tem seis milhões, quando apenas dez mil (os que, estimo, tenham ontem verdadeiramente apoiado a equipa) desempenham o seu papel, cumprem a sua missão, e se assumem como verdadeiros Benfiquistas.
Em segundo lugar é preciso
salientar a funesta actuação do árbitro da partida, que num golpe de mágica, como há muito não se via, decidiu escamotear o golo da tranquilidade ao Benfica, criando as condições para aquilo que acabou por acontecer. Ninguém poderá dizer que eu não avisei, pois se há coisa que tenho boa é a memória.
Independentemente do breve mas revelador passado de Vasco Santos, não consigo aceitar a nomeação de árbitros do Porto para jogos do Benfica. Para além da óbvia questão de princípio – duvido que o Real Madrid seja apitado por catalães ou vice-versa -, de uma cidade onde nem juízes nem polícias são de confiança, pouco se pode esperar dos árbitros. Vasco Santos tentou, e conseguiu, impedir o Benfica de ganhar. Ele sim, de certo, viajou feliz.
Finalmente há que falar da equipa do Benfica.
Depois de uma primeira parte onde o gelo vindo das bancadas contaminou os jogadores, os primeiros quinze minutos da segunda foram de grande nível, e pareciam suficientes para garantir a vitória. Mas
como tantas vezes tem acontecido ao longo da época, a equipa de Quique Flores viu-se depois em grandes dificuldades para segurar o resultado da forma mais adequada – circular a bola, retirar iniciativa ao adversário, adormecer o jogo.
Em vantagem, à medida que o tempo passava, as linhas do Benfica iam recuando cada vez mais, convidando o Vitória de Setúbal a tomar a iniciativa das operações e, consequentemente, a pôr em perigo a baliza de Quim.
Noutras ocasiões (Naval, E.Amadora, Guimarães) a coisa correu bem. Desta vez, como em Matosinhos, tudo acabou mal, sendo que a tipologia dos minutos finais dos jogos foi semelhante em quase todas as jornadas, algo que deve preocupar bastante a equipa técnica benfiquista.
Como já disse, este jogo parecia-me fundamental. Se por um lado urgia afastar os fantasmas de Atenas - e o coro de abutres que se seguiu, e de que são reveladoras as capas do Record e do Jogo no passado sábado -, por outro era uma oportunidade de ouro de levar o nome do Benfica até ao lugar mais alto da classificação, com tudo o que isso acarretaria de mobilização e entusiasmo em redor da equipa. Mas talvez mais importante do que tudo isso, seria manter o F.C.Porto e o Sporting numa situação de dependência de terceiros, que seria extremamente interessante de prolongar (ou mesmo acentuar) até ao início da segunda volta, altura em que tudo se poderá decidir com três clássicos quase consecutivos. Tudo ruiu, e
agora, sem liderança, com vantagem reduzida, com jogadores intranquilos e adeptos de costas voltadas, segue-se uma dificílima visita ao Funchal, onde um empate poderia à partida ser positivo, mas agora a vitória se torna quase imprescindível. Espero que lá mais para Maio não nos venhamos a lembrar desta triste jornada.