PONTAS SOLTAS, GOLPES DUROS

Já falei do debate em sentido mais lato. Já disse que, quanto a mim, houve um vencedor inesperado, dois que se saíram bem, outros dois que, coitados (sem ofensa), se saíram mais ou menos como se esperava, e um claro derrotado: Noronha Lopes.
Se forem aos arquivos mais recentes, poderão reler que Noronha sempre tem sido, e teria sido, a minha segunda opção, caso Rui Costa não se recandidatasse. Digo agora que, depois deste descalabro televisivo, terá descido duas posições na minha lista. Passou para trás de um Vieira que ainda está ali para as curvas, pelo menos em capacidade negocial e de obra (um amigo disse-me com graça, que se os casos judiciais tivessem terminado, a bem ou a mal, podia estar ali o nosso Isaltino), e passou também para trás de João Manteigas, que pese embora a inexperiência, a mais do que duvidosa capacidade de liderança e algum populismo, pareceu, de facto, conhecer muito melhor o clube por dentro do que Noronha.
Lembro algumas pontas soltas do debate, que, no meu ponto de vista, muito contribuíram para a conclusão que me sinto obrigado a tirar:
58 DIAS - Entre muitas desvantagens, a vantagem de envelhecer é que nos lembramos de muita coisa. E eu lembro-me de Noronha Lopes (cujo nome nunca me foi estranho: é da minha terra, conheço familiares) entrar e sair, de forma fulminante, do Benfica. Lembro-me que ele, tal como aliás Vilarinho (em quem votei praticamente sem conhecer, pois na altura valores mais altos se levantavam), eram contra a construção de um novo estádio. Foi Vieira, com Mário Dias (o então injustamente apelidado de "lobby do betão"), com apoio do BES, da Somague, da Câmara Municipal, da UEFA (em contexto de Euro2004), que insistiram, convenceram Vilarinho, e avançaram. Ainda bem.
Não há mal nenhum em ter sido contra a construção do estádio. Teria sido um erro não o construir, mas eu próprio na altura, com o Benfica afundado em dívidas, tive algum receio desse projecto. Embora apenas dipusesse da informação que estava nos jornais, e Noronha estivesse lá dentro.
Mas não é coerente acusar os diretores financeiros de Rui Costa de saírem do clube passado pouco tempo (e foram apenas dois, não cinco como demmagogicamente afirmou), e o próprio Noronha ter tido uma passagam tão veloz e insignificante pelo Benfica - pelo qual, aliás, só voltou a interessar-se em 2020, após o que se seguiu nova hibernação até há uns meses atrás.
Não sei se foram 58 dias, 59, ou 61. Sei que Noronha ficou sem resposta. Ironicamente, eu diria, abananado...
NUNO GOMES/PROENÇA - Foi outro momento bastante singnificativo do debate. Afinal, uma das maiores fragilidades de Rui Costa (e que também lhe aponto, sempre apontei e voltarei a apontar) está igualmente no âmago da candidatura de Noronha: o seu vice-presidente para o FUTEBOL foi um entusiasta apoiante de Pedro Proença. Ele que também sofreu, em campo, até durante mais tempo do que o próprio Rui Costa, com as diatribes do antigo árbitro. Eis mais uma situação em que Noronha Lopes teve de engolir o seu ar altivo. Quem diz o que quer, ouve o que não quer.
ESTRUTURA PESADA - Do que conheço do futebol, sempre me foi bastante claro que as estruturas de decisão numa equipa têm de ser tão reduzidas quanto possível. Um presidente, um director, e um treinador (naturalmente com assessores ou adjuntos, conforme o caso, mas sem poder de decisão). Caso contrário, aumentam os riscos de incompatibilidades, inflamam-se egos, perde-se a reserva da informação interna, e dilui-se a autoridade. Para tomar uma decisão rápida, eficaz e discreta, não pode ter de se falar com cinco ou seis pessoas, nem fazer-se reuniões por tudo e por nada. Ora Noronha Lopes não tem outra coisa para apresentar senão uma estrutura pesadíssima, com muitas  pessoas, muitos cargos - alguns sem que se perceba bem para que funções em concreto -, tudo gente muito qualificada (não o ponho em causa), mas, também por isso, pouco habituada a ser contrariada, e talvez propensa a algum protagonismo. Todos os restantes candidatos lhe apontaram esse problema, sem que ele conseguisse escapar-se do interior do seu próprio equívoco. Um clube de futebol não é como outra empresa qualquer. Pelo mediatismo, pela paixão, pelo tipo de pessoas com quem terá de negociar, pelo tipo de funcionários etc. Se Noronha for presidente, e insistir em acumular nomes e cargos à sua volta, talvez para se esconder atrás deles, as coisas irão fatalmente correr mal.
AUSÊNCIA DE OBJECTIVOS - Noronha queixa-se muito do Benfica ter conquistado poucos títulos neste mandato, mas também não apresenta nenhuma proposta concreta que nos faça pensar que com ele "é que vai ser". Apenas lugares comuns, o que também foi notado por outros candidatos. Até Cristóvão Carvalho, com a sua megalomania, ao menos disse o que queria (um título europeu em sete ou oito anos) e o que não queria fazer (desde logo não queria gastar dinheiro em infraestruturas). Martim Meyer agarra-se ao não-sei-quantos Joncker (?). Vieira tem a sua obra a falar por si. Rui Costa é o incumbente. Manteigas também é evasivo quanto ao futuro, mas não tão insistente na tecla do palmarés. 
Todos nos queixamos de ganhar menos do que queríamos. A questão não é se ganhámos pouco ou muito (todos achamos que foi pouco). A questão é como, e o que, se vai fazer para ganhar mais. Um candidato a presidente dizer que quer ganhar mais, não é nada. E se for eleito, cheira-me que a meio do mandato as contas serão reprovadas duas vezes...
CFO EM PART-TIME - Já ouvi, já li, que se vai dedicar ao Benfica de alma e coração, a 200%, e por aí fora. Toda essa manifestação de vontade carece, a meu ver, de clareza. Afinal, o CFO do Benfica assim como outros dirigentes para outras áreas, vão estar ou não a full-time no clube? Vão manter, ou não, outras actividades por fora? Não fiquei nada convencido, sendo que o Benfica (todo o futebol profissional) já não é o de tempos antigos, quando o presidente ia à Luz ao fim do dia assinar cheques e pouco mais. Foi algo com que o candidato Noronha também foi confrontado, e pelo menos neste debate não conseguiu responder de forma convincente.
POSTURA ALTIVA - Em entrevistas Noronha Lopes até tem parecido simpático e sorridente. Ao ser contrariado em directo, ao ser confrontado com o seu desconhecimento do meio onde se quer meter, ao ser desmascarado em algumas das suas bandeiras de campanha, Noronha visivelmente irritou-se, e deixou o pé aristocrata resvalar para o chinelo. Todos os outros candidatos, mesmo os mais, diria, "pequenos", optaram por nunca esquecer que aquela era uma montra para o debate de ideias, mas também uma reunião de seis benfiquistas. Nisso Manteigas foi inteligente e, sentindo-se talvez acossado pelos acontecimentos da última AG, apareceu como devia: um benfiquista entre benfiquistas. Já Noronha passou o tempo  das suas intervenções virado para Rui Costa, com ar altivo, arrogante e desafiador, interpretando ali, ao vivo e a cores, uma espécie de benfiquismo - que se vê nas redes sociais, que se vê nas caixas de comentários (até aqui...), que se vê, infelizmente e sobretudo, nas AG - segundo a qual o clube é uma arena para confronto político. 
Logo de entrada pareceu nervoso. à medida que a noite avançava, à medida que era desmascarado por todos os restantes (houve momentos em que Vieira e Rui Costa até sorriam), entrou num caminho sem saída. A noite estava perdida. A eleicção? Vamos ver.

4 comentários:

Anónimo disse...

Não, LF. Não.
Esta reta final de campanha está-lhe a fazer mal. Digo honestamente, com simpatia e alguma tristeza.

Quanto aos 58 dias, diz que Noronha ficou sem resposta. Terá adormecido, não? Noronha revelou a ata de reunião da Administração onde se decidiu avançar com o estádio. A sua assinatura consta da mesma. Vieira e Rui Costa afirmaram não ser genuína (que é um violento ataque pessoal - é acusá-lo de ser mentiroso!). Pois Noronha publicou hoje a ata. Para todos vermos. Curioso, nem Rui Costa nem Vieira estavam presentes; pois não eram então Administradores do Clube. Mas não tiveram pejo em acusá-LO de mentir.
Veja por si. Está disponível.

Quanto ao anterior apoio de Nuno Gomes a Proença… lamento novamente, mas é de uma incoerência imensa sua. Nuno Gomes não é candidato a Presidente. O tema não lhe fica bem no currículo, mas não é candidato a Presidente. O único candidato a Presidente que, oficial e publicamente, apoiou Proença… é o candidato que você apoia: Rui Costa. Parece que aí não há problema.

A ausência de objetivos é outro diapasão onde o seu critério, infelizmente, é incoerente. Acusa Noronha de não ter… objetivos concretos no número de conquistas. Quer promessas dessas? Se prometesse 4 títulos em 4 campeonatos, votaria nele?
E… Quais são os de Rui Costa? Sabe? É que… pelo menos aos sócios, não os divulgou.

Sobre o CFO em part time, convido a ler a entrevista de José Theotónio à ECO, ontem. Eu penso que é elementar que só uma lista, hoje; pode apresentar um CFO já em full time: a do incumbente, com um CFO (o 3o em 4 anos) em funções! Os restantes só o poderão assumir SE vencerem, não acha? A menos que considere que José Theotónio devia suspender as suas funções atuais no Grupo Pestana… antes da eleição.

Quanto à postura altiva, não tenho contraditório. É um juízo de caráter, seu. Na minha análise, é irrelevante. Não vou votar num compincha.

LF disse...

Então ele não esteve apenas 58 dias no clube? Olhe que eu até já publiquei a ata.
É isso que eu discuto. A questão do estádio teve outros contornos ee até o então presidente Vilarinho era contra.
O ponto é que Noronha esteve 58 dias e...bazou. A isso ele não respondeu, e foi isso que o enervou.

Nuno Gomes é candidato a vice-presidente para o...FUTEBOL.
Não é um anónimo membro do Conselho Fiscal. Vai ser, se Noronha ganhar, o homem do FUTEBOL.

Não é prometer títulos. É prometer alguma coisa para lá chegar. Noronha fala da estrutura, da reorganização, de isto mais aquilo, mas de futebol, quando fala, mostra um desconhecimento quase cândido. Não tem uma estratégia para o futebol. Isso para mim ficou claro.

Veremos se o CFO não mantém algumas actividades por fora. Eu li essa entrevista. Mas houve outras declarações no passado menos claras. E Noronha também se engasgou um pouco com o tema.
Não é apenas o CFO. Veremos se outros dirigentes estarão a temppo inteiro.
Talvez. Mas fico com a clara sensação de que se o assunto não fosse trazido para a mesa, Theotónio e outros iriam alegremente desempennhar funções em part-time.

Nuno disse...

Assim ficaremos, então.

Tem razão quanto ao período em que Noronha teve funções efetivas no mandado de Vilarinho. Esteve muito mais tempo como suplente, integrando o CA (como também consta em atas).

Da questão do tempo do mandato de Noronha, só retive o ataque que Rui Costa fez quanto ao estádio. Foi tudo no mesmo round e foi o que retive.

Eu não gosto nada que acusem alguém de mentir… e ainda menos quando este tem na mão provas que desmentem a acusação. E quem acusa nem lá esteve. E assume pouco ler e pouco saber.

Anónimo disse...

Quando Noronha Lopes atacou Rui Costa por este ter dito "que não podia ir contra a corrente" do não-apoio a Proença Rui Costa retorquiu que "Não era que não podia, era que não queria".

Alterando a sua frase para o sentido correto, "Quem ouve o que não quer, diz o que não deve", e o que fica é que Rui Costa preferiu meter a viola no saco e não se chatear muito a fazer a defesa dos interesses do Benfica