UM PENÁLTI ESPETADO NA ALMA
Perdoem-me os leitores o tom algo egocêntrico, mas um blogue serve também para desabafar: esta foi a derrota da Selecção Nacional que mais me custou a engolir, pelo menos desde que, em 1984, aos 14 anos, acabei lavado em lágrimas com um golo de Michel Platini na baliza de Manuel Bento. Nem mesmo a Grécia me deitou tão abaixo - talvez por, nessa ocasião, estar presente no estádio (cujo ruído sempre dissipa um pouco a frustração); ou, quem sabe, por o golo de Charisteas, no início da segunda parte, ter anunciado desde cedo que algo iria correr mal.Pensava que Portugal poderia mesmo ganhar (escrevi-o aqui), e, chegado aos penáltis, julguei poder confiar na queda de Rui Patrício para os defender. Mais ainda depois de ter parado categoricamente o primeiro.
É duro perder assim, e não concordo nem um pouco com a ideia do outro Bento, o Paulo, segundo a qual esta é a melhor forma de sair derrotado de um jogo, e de um Campeonato. Admito que para um profissional – com a sensação de dever cumprido - o seja. Para um adepto, e sobretudo para um adepto cuja paixão pelo passado, e pelos arquivos, leva a valorizar a dimensão histórica dos resultados, isto é uma tragédia.
Por muito que me belisque para desafiar a hipótese de tudo não passar de um pesadelo, a verdade é que Portugal ficou a centímetros da final de um Europeu, coisa que talvez não volte a acontecer nos próximos vinte anos. É este tipo de oportunidade perdida (como a meia-final europeia do Benfica em Braga, como os penáltis de Estugarda), que mais me custa a digerir no desporto. E se Portugal tem encaixado um pomposo 3-0 da campeã mundial, a resignação tomaria o lugar da tristeza.
O jogo foi pobrezinho em termos de espectáculo. Fosse um Itália-Alemanha assim, sensaborão, cheio de passes errados, com muitos nervos e nenhum golo, e talvez tivesse adormecido a meio da segunda parte. Com Portugal em campo, os níveis de ansiedade subiram até a um ponto a que só os grandes jogos internacionais do Benfica conseguem chegar.A equipa lusa equilibrou a contenda, e conseguiu, com rigor e organização, neutralizar a principal arma espanhola (trocas de bola junto à área adversária). Diga-se que também a Espanha neutralizou Cristiano Ronaldo, e as transições rápidas dos portugueses. Vimo-nos assim num jogo de xadrez, em que as equipas encaixaram uma na outra, e onde as poucas oportunidades acabaram por ser desperdiçadas (livres de Ronaldo, e aquele lance aos 89 minutos para Portugal; remates de Iniesta no início do jogo, e já no prolongamento, para os espanhóis).
Chegámos aos penáltis, e na altura (com a equipa nacional a acusar mais desgaste que a Espanha, e com Pedro e Navas a incendiarem as alas) pareceu-me ser esse o caminho ideal para uma vitória histórica, e consequente festa de arromba. Tudo começou bem, mas depois...Um bateu na barra e saltou para fora. Outro foi ao poste e acabou por entrar. A Espanha está na Final. Portugal volta para casa.
Haverá tempo para analisar o Europeu mais friamente. Poderei dizer desde já que ganhámos uma equipa, e que João Moutinho renderá um dinheirão - o que não é boa notícia. O Mundial é já daqui a dois anos, e com a mesma equipa, com um Cristiano Ronaldo ao nível dos jogos com Holanda e Rep.Checa, com Nani e Meireles (ambos da Premier League) em melhor condição física, e com Nélson Oliveira mais crescido, podemos ter esperanças de fazer figura. Mas, terminando como comecei, nada disso me consola hoje de uma intensa dor na alma. Vejo o Futebol como um brinquedo de emoções (quase sempre fortes). Não tenho, felizmente, problemas com a vida ou comigo próprio que me façam utilizá-lo como escape para frustrações, nem como instrumento para canalizar ódios recalcados. Para mim, trata-se simplesmente de alegria e tristeza. Por vezes, euforia e desolação. Ora aqui está esta última, manifestada de forma cruel.






Como se vê, o equilíbrio entre os dois vizinhos ibéricos em fases finais de grandes competições, é total. Uma vitória para cada lado, um empate, 2-2 em golos. E até em futebol jogado, tanto quanto me lembro, as coisas se equivaleram - sempre com incerteza até ao fim, igualdade em 84, um pouco mais Portugal em 2004, um pouco mais Espanha em 2010. Um pormenor: o golo espanhol, na África do Sul, foi obtido em fora-de-jogo.


Nunca, na sua história, o Benfica havia ganho três campeonatos, numa só temporada, nas modalidades de pavilhão. Com o título de Futsal, conquistado este sábado, e com os de Basquetebol e Hóquei em Patins, já anteriormente selados, o clube encarnado alcançou agora esse feito.
Londres, INGLATERRA-PORTUGAL, 2-1
Marselha, FRANÇA-PORTUGAL, 3-2 (ap)
Bruxelas, FRANÇA-PORTUGAL, 2-1 (ap)
Lisboa, PORTUGAL-HOLANDA, 2-1
Munique, FRANÇA-PORTUGAL, 1-0


Uma equipa compacta, e um líder incontestado, capaz de decidir jogos. O que mais podemos desejar?


Todos estes factos são profundamente inquietantes para quem gosta de futebol. Quero acreditar no que vejo, mas, sinceramente, já não consigo. Em Portugal já sabíamos o que se passava. Agora, também na Europa deixou de haver preocupação em esconder seja o que for. O Rei vai nu. E andam criminosos à solta. Cá, e lá. Com estes fenómenos, com os casos de apostas ilegais, com guarda-redes e defesas que umas vezes defendem, noutras apenas fingem que o fazem, continuar a gostar de futebol é, cada vez mais, um acto de coragem.
Tinha aqui pedido mais Ronaldo. No fundo, todo o país o tinha feito, sabendo quanto vale o nosso melhor jogador, e sabendo que as exibições diante da Alemanha e, sobretudo, da Dinamarca, tinham deixado bastante a desejar.
Agora segue-se a República Checa, e o maior perigo poderá estar no eventual deslumbramento que um adversário de segunda linha (não há como dizer isto de outro modo) possa causar entre os nossos jogadores. Neste tipo de competições todas as equipas estão a top, e todas têm bons jogadores. Mas nenhuma tem Ronaldo, e será uma vez mais nas suas costas, e nos seus pés, que as nossas esperanças estarão depositadas. 
País de fadistas e de poetas, Portugal carrega consigo uma alma sofredora, da qual é raro conseguir libertar-se. Quando as coisas parecem fáceis, rapidamente desligamos a corrente, empinamos o nariz, e cruzamos os braços. E só quando a angústia aperta, voltamos à vida, conseguindo então mostrar a melhor das nossas capacidades – a de improvisar, desenrascando, e alcançando, nos limites, aquilo que outros metodicamente constroem.
Com Fábio Coentrão entregue a dois, e por vezes três Vikings assanhados (a entrada de Mikkelsen trouxe uma nova vivacidade àquele flanco), Portugal ficou à mercê de um assalto que, mais cedo ou mais tarde, traria forçosamente consequências. Quando Bendtner voltou a marcar, tudo parecia terminado ali, e já se imaginava a comitiva portuguesa a ser insultada, na próxima segunda-feira, na chegada à Portela.

