CLÍNICA DA LUZ

Artur, Siqueira, Sílvio, Fejsa, Matic, Salvio, Enzo Perez, Ruben Amorim, Sulejmani, Cardozo e Markovic. Ao contrário do que possa parecer, não se trata de uma proposta de “onze” apontada aos próximos jogos. Trata-se, sim, da longa lista de ausências (a maioria por lesão, algumas também por castigo) que afligiram o Benfica nesta primeira fase de temporada. Para completar o inusitado cenário, resta acrescentar o próprio treinador Jorge Jesus - também ele ausente por castigo durante várias semanas. Salvio, que havia estado em destaque na pré-temporada, lesionou-se à 3ª ronda, para não mais voltar a jogar. Amorim, que se fixou como titular em Atenas, permitindo então a adopção de um novo sistema táctico, lesionou-se no jogo seguinte. Cardozo, que depois da novela de início de época recuperara a sua melhor forma, e mostrava pontaria mais afinada do que nunca, também ficou no estaleiro, onde se mantém. Siqueira, que aparentava ter condições para resolver o velho problema da ala esquerda da defesa, rapidamente se viu, também ele, impedido de jogar. Matic e Enzo foram castigados à vez, inviabilizando, durante duas jornadas, a construção do melhor meio-campo encarnado. Sílvio só em Outubro pôde discutir um lugar. Fejsa lesionou-se em Paris. Markovic em Lisboa. Sulejmani em Belgrado, e, por fim, Artur em Olhão. Quando um destes dias ouvia um comentador televisivo culpar Jesus pela indefinição do onze-base do Benfica, quase tive vontade de rir. É verdade que nem sempre os jogadores têm demonstrado a fibra de campeões que se vira, por exemplo, ao longo da maior parte da temporada passada. É também verdade que alguns dos reforços demoraram tempo demasiado a adaptar-se ao grau de exigência do clube. Mas, caramba, com tantos contratempos, manter ainda assim o 1ºlugar da tabela (embora de forma partilhada), é algo que deveria conferir algum pudor à crítica. Sejamos justos. O que seria dos nossos adversários directos caso padecessem de tão extenso rol de contrariedades? Estariam na luta?

UM ANO DURO

Não é fácil escrever sobre 2013. Andámos entre o céu e o inferno, passámos da euforia à depressão, tudo em apenas vinte dias. E ainda não nos recompusemos totalmente. No dia 6 de Maio estávamos, 23 anos depois, apurados para uma final europeia, e bastava-nos vencer Estoril, Moreirense e V.Guimarães para, 27 anos depois, voltar a conquistar a “dobradinha”. Vivíamos, então, às portas de uma das melhores épocas de sempre. No dia 26 de Maio, tínhamos perdido tudo. Os golpes foram fundos. Sobretudo o desferido por um tal Kelvin, cujo nome ainda me arrepia pronunciar, aos 92 minutos de um jogo cuja memória ainda me custa digerir. Na hora do balanço, não é justo, não pode ser justo, limitar o ponto de vista estritamente aos troféus que nos fugiram das mãos. Todo o percurso dos quatro primeiros meses do ano foi fantástico, e merece ser relevado. A chegada a uma final europeia não é, não pode ser, uma perda - entra para a história, como, por exemplo, a de 1983. A mágoa não tem de trazer indignação, agitação, nem qualquer caça às bruxas. O que não significa que descole facilmente das nossas almas, até porque a nova época ainda não nos deu motivos para esquecer a anterior. Para lá do Futebol, pode dizer-se, porém, que 2013 foi um ano de sucesso. À cabeça de uma lista de triunfos surge o Hóquei em Patins, com o inédito título europeu, conseguido em circunstâncias particularmente saborosas (de que, infelizmente, devido a um motivo familiar de força maior, não pude desfrutar) -, ao qual se seguiram, já na nova temporada, outras conquistas internacionais. Os campeonatos de Basquetebol e Voleibol também vestiram de vermelho. O Futebol Formação trouxe-nos títulos em duplicado (Juniores e Juvenis) o que não acontecia desde 1989. O impressionante Museu Cosme Damião foi inaugurado. A Benfica TV entrou numa nova fase da sua vida. 2014 está à porta. A serenidade e a união são as melhores chaves para o tornar melhor que 2013. Um desejo? Que a sorte nos devolva aquilo que nos retirou.

NESTA DATA QUERIDA

A Benfica TV festejou esta semana o seu quinto aniversário. E se há projectos com bastos motivos para festejos, este é seguramente um deles. Poucos acreditariam, em 2008, que tão ousada iniciativa redundasse no êxito que hoje se vê. Depois de um período de amadurecimento, a estação entrou numa nova era da sua existência quando, no último Verão, passou a transmitir os jogos da nossa equipa principal de futebol, juntando também à grelha de programação aquela que é, indiscutivelmente, a mais empolgante liga europeia da actualidade. Devo confessar que, durante algum tempo, duvidei que tal fosse possível. Parecia-me um sonho demasiado alto, e uma iniciativa demasiado arriscada, avançar para um canal de TV com as características daquele que temos hoje, e que faz as delícias de todos os benfiquistas. Tenho de dar a mão à palmatória. Assinante deste o primeiro momento, vejo a programação melhorar dia após dia, vejo os meios técnicos envolvidos trazerem qualidade superlativa às transmissões – não só do futebol, como também de todas as modalidades que compõem o puzzle do eclectismo encarnado. Vejo! Sobretudo vejo, com gosto, fervor clubista, mas também com a exigência de um telespectador atento, que aprecia o trabalho de profissionais de excelência, os quais, dia após dia, hora após hora, fazem o Benfica entrar-nos pela casa dentro. Não podemos adormecer à sombra do êxito conquistado. Há sempre espaço para melhorar, para inovar, e essa deve ser a matriz de pensamento daqueles que trabalham na casa. Mas o que foi feito nestes cinco anos constitui matéria suficiente para que todos os envolvidos estejam de parabéns. Deixando uma palavra especial para o Ricardo Palacin (profissional, benfiquista e, se me permitem, também amigo), e, nele, para todos os restantes colaboradores da Benfica TV, não posso deixar de saudar aquele que é o principal obreiro de todo o projecto: o Presidente Vieira, cuja sucessão de realizações vai tendo cada vez menos paralelo na história centenária do clube da Luz.

TUDO PELO TÍTULO

Decorridas onze jornadas da Liga, estamos finalmente no topo da classificação. A época iniciou-se aos soluços, mas, com o decorrer das semanas, e resistindo às contrariedades que nos surgiram por diante (de arbitragens altamente penalizadoras, a uma série interminável de lesões), lá chegámos ao lugar onde gostamos de estar. Independentemente da questão formal sobre quem lidera efectivamente a tabela, a verdade é que nenhum clube tem mais pontos que o Benfica, sendo que já defrontámos, fora de casa (empatando), aquele que figura a nosso lado. Não é preciso puxar muito pela memória para nos recordarmos quão precário pode ser um primeiro lugar antes do final da prova. Porém, para quem até há pouco mais de um mês andava por uma tristonha terceira posição, a cinco pontos da liderança e a três do segundo colocado, tomar a dianteira não pode deixar de constituir factor de motivação acrescida – até pelo simbolismo que tal representa, depois das especulações e desconfianças que acompanharam a equipa desde o inglório final da temporada anterior. Esse dossier, de resto, parece - agora sim - finalmente fechado. O que se passou por lá ficou, e o momento manda que nos unamos em torno dos objectivos que queremos, e podemos, alcançar. O principal de todos é precisamente este Campeonato, que tem, até ao Natal, três jogos fundamentais. Arouca, Olhanense e V.Setúbal são o tipo de partida em que é rigorosamente proibido vacilar, e onde o grande desafio se coloca no âmbito dos índices de concentração competitiva. Neste momento, nada - nem mesmo o sonho de um dificílimo apuramento europeu -, nos pode afastar da rota das vitórias domésticas. Os próximos nove pontos têm de ser nossos, de forma a entrarmos em Janeiro com a moral em alta, e recebermos, de peito feito, aquele que ainda considero tratar-se do principal opositor nesta luta. O Campeonato parece querer pôr-se a nosso jeito. Não podemos voltar a desperdiçá-lo. A hora é de união, e não permite hesitações: todos por um, e tudo pelo título!

O GOLO

Ao longo da partida do passado sábado, e mergulhado na ansiedade de ver o relógio correr sem que a bola entrasse na baliza do SC Braga, lembrei-me de Óscar Cardozo. É verdade que temos outros avançados de qualidade. Mas ninguém, como o paraguaio, é tão eloquentemente sinónimo de golo. E, por muito que nos esforcemos por encontrar motivos para ganhar ou perder um jogo de futebol, por mais sofisticadas que sejam as divagações tácticas, por muito que louvemos a segurança dos defesas, a regularidade e eficiência dos médios, a criatividade e velocidade dos extremos, são os golos que garantem as vitórias, e são os goleadores que normalmente os fazem. Daí a minha enorme admiração por eles. O que eu gosto no futebol é de golos. Confesso que não me impressionam particularmente fintas, toques de calcanhar, chicuelinas, rabonas ou outras demonstrações circenses, quando não têm a consequência devida. Sem a bola dentro da baliza, nada feito. Por via disso, são os pontas-de-lança, com a sua eficácia, com o seu sentido de desmarcação, com a arte de aparecer no momento e no local certos, com a capacidade de lutar duramente entre os centrais adversários, de ganhar duelos nas alturas, que merecem a minha maior dose de admiração. Sei que esta não será uma opinião partilhada por todo o “Terceiro Anel”. Lembro-me como Nené, Magnusson, Nuno Gomes, e o próprio Cardozo, foram, cada um a seu tempo, incompreendidos por parte significativa dos adeptos do Benfica. Porém, foram eles que mais vezes me fizeram levantar das bancadas, e soltar gritos de alegria. É a estes, e outros, que devo a minha paixão pelo jogo, e pelo nosso Glorioso clube. Também por isso, defendi neste espaço a importância da manutenção de Óscar Cardozo no plantel encarnado, quando muitos (com os nossos adversários à cabeça) o quereriam ver pelas costas. Um homem que marca quase 200 golos num clube não pode, jamais, ser descartável. É este o meu género de ponta-de-lança. E Eusébio, que sabe de golos como ninguém, também o diz.