SEM ESTOFO NEM SORTE

Há cinco jogos sem vencer, há quatro sem marcar um único golo de bola corrida, distante da liderança do campeonato e com situação muito complicada na Liga dos Campeões, o Benfica volta a mergulhar numa crise, que se vai repetindo ciclicamente e com demasiada frequência. Os adeptos do clube da Luz reagem naturalmente com desalento e frustração, descarregando sobre toda a equipa o seu descontentamento. No final de jogo de ontem, a vaia com que foram brindados jogadores e técnico revela bem o estado de desânimo da família benfiquista.
É bom que se tenha contudo a lucidez de entender e relembrar como se chegou a esta situação, qual a raiz dos problemas e qual o seu responsável. Quem faz sair dum plantel (que ficou a dois pontos do título, e perto de atingir uma final europeia) treze jogadores – entre eles os dois melhores -, contrata dezassete, muitos dos quais já com a época a decorrer, todos eles sem experiência internacional e com tudo ainda por provar (gastando com isso cerca de vinte e cinco milhões de euros), e substitui o treinador após a primeira jornada (e toda uma pré-época a trabalhar um determinado modelo), já depois de ter prescindido do director desportivo, não pode esperar outra coisa que não seja um retumbante fracasso. Logo na altura aqui disse que a época estaria comprometida, e infelizmente não foi necessário esperar muito para o comprovar. O Benfica é neste momento – como não podia deixar de ser – uma equipa sem rotinas, sem automatismos, sem experiência, ainda à procura de uma identidade, e objectivamente sem condições para disputar uma Liga dos Campeões com um mínimo de aspirações.
Nem tudo é mau. O plantel tem jogadores com talento e com futuro, que precisam de ser trabalhados para um dia poderem dar grandes alegrias aos benfiquistas. Di Maria, Rodriguez, Maxi Pereira, Adu, Binya, Edcarlos e Cardozo são jovens, todos eles à procura de desenhar com sucesso as suas carreiras na Europa, e se forem apoiados e acarinhados podem, dentro de algum tempo, ser a base de uma grande equipa. Por agora estão longe de o ser, e nenhum treinador do mundo poderia operar o milagre de, em cerca de um mês, conseguir que o fossem. O Benfica é assim, por agora, um grupo de jogadores mais ou menos talentosos, que individualmente conseguem alguns fogachos, mas que não são ainda capazes de interpretar, em termos colectivos, um futebol de qualidade.
O panorama é este e não há volta a dar-lhe. É necessária paciência, muita paciência - que raramente é apanágio dos adeptos de futebol -, pois a vida não anda para trás, não é possível descometer os erros cometidos, sendo necessário ter cabeça fria para, desta situação, se partir para um futuro (nesta ou na próxima época) mais lustroso do que este acinzentado presente. É pois necessário aceitar com naturalidade derrotas como a de ontem, não dramatizar – afinal de contas, perder na Champions acontece a qualquer um e não constitui motivo de vergonha -, contribuir para a progressiva integração dos novos jogadores, e esperar que entre Taça da Liga e Taça de Portugal, algum troféu possa pingar, para além de, naturalmente, não perder de vista o objectivo primordial da temporada que, como disse Camacho, passa por garantir o apuramento para a próxima Liga dos Campeões onde, a não serem cometidos os erros destas duas últimas épocas, então sim, talvez o Benfica já possa estar em condições de se reencontrar com o seu prestigioso passado.
Não seria preciso dizer muito mais para justificar a derrota de ontem. Diante daquela que é talvez a melhor equipa de leste na actualidade, as carências dos encarnados foram dramaticamente postas a nu. O Benfica perdeu, perdeu bem, e está, depois dos resultados de ontem, sejamos claros, praticamente afastado de qualquer hipótese de apuramento.
Podia ter acontecido outro resultado ? Podia. O Benfica, além de todas as fragilidades que evidenciou, também não teve a sorte do jogo do seu lado. Se Di Maria tem disparado uns centímetros mais abaixo a bola que atirou à trave e assim inaugurasse o marcador, talvez tudo tivesse sido diferente. A jogada do golo do Shakhtar surgiu pelo lado direito da defesa benfiquista, numa altura em que Nelson estava caído no relvado. Já na ponta final do desafio, e perante um Shakhtar apostado em fazer passar o tempo – nem sempre da forma mais desportiva, diga-se -, os encarnados criaram mais oportunidades de golo, uma delas flagrante quando Edcarlos cabeceou, já sem Pyatov na baliza, para as pernas de um defesa ucraniano que, sobre a linha, evitou o empate. Houve ainda um lance em que ficou a ideia de ter sido cometida grande penalidade, mas nem com o árbitro – também muito complacente com o anti-jogo do Shakhtar – o Benfica foi feliz.
Se compararmos a posse de bola e a quantidade de remates de uma e outra equipa, veremos que os encarnados talvez até pudessem ter merecido, segundo esses critérios, pelo menos, o empate. Não deixaria de ser um mau resultado, e não esconderia, de todo, os problemas que Camacho está a enfrentar para fazer deste lote de jogadores, extenso, desequilibrado, inexperiente, uma equipa que se possa bater de igual para igual na Europa. Talvez mostrasse apenas, e isso é também inegável, o esforço que todos os jogadores estão a fazer para rapidamente crescerem como conjunto. Mas sabemos que uma prova desta natureza raramente é piedosa para com meras boas intenções.
Para além do problema da concretização – e que problema… -, há muitas mais arestas a limar nesta equipa. A forma como os extremos se (não) articulam com os laterais, em processo defensivo, e consequentemente (por prudência), em processo ofensivo, é bem reveladora do tipo de trabalho que Camacho ainda tem para fazer com os jogadores. Rodriguez e Di Maria são jogadores de bola no pé, que pouco se dão a tarefas de recuperação. Obrigam por isso a que os laterais não se envolvam no ataque, sob pena de, destapando os corredores, não se verem compensados em transição defensiva. Sabendo que Rui Costa tem 35 anos, e que Cardozo vem visivelmente habituado a que joguem para ele, o Benfica viu-se frequentemente partido em dois: os que defendem e os que atacam.
Quando em transição ofensiva a bola chega aos pés dos criativos, quer laterais quer médios de primeira linha temem desposicionar-se, obrigando a que aqueles, sem linhas de passe, apostem no lance individual, obviamente bem mais fácil de contrariar, sobretudo por defesas fortes e experientes. Resta no meio de tudo isto um homem – Rui Costa – que consegue, enquanto dura, personalizar no centro do terreno um outro tipo de futebol. É dele que parte todo o jogo ofensivo encarnado, pelo que quem o consiga anular, anula o Benfica. O Shakhtar, com uma impiedosa marcação de Lewandoski, consegui-o, e aí venceu o jogo.
A questão dos dois pontas-de-lança talvez seja legítima de se colocar, mas o que é certo é que, jogando os dois, não se notaram grandes alterações ao figurino qualitativo do futebol benfiquista. A eficácia foi a mesma: zero!. A substituição de Di Maria por Binya pareceu estranha – confesso que na altura não a entendi -, mas a verdade é que foi a partir daí que se deu o melhor (menos mau, vá lá) período do Benfica em todo o jogo, o que abona em favor do técnico espanhol.
Por tudo aquilo que acima já disse, não creio que o duplo confronto com o Celtic possa ser encarado com grande optimismo. Resta pois aos benfiquistas aprender a esperar por melhores tempos. Não têm outro remédio. Não se pode despedir o treinador nem revolucionar novamente o plantel, o que representaria atrasar ainda mais um processo que leva, necessariamente, alguns meses (anos ?) a dar frutos.
O Benfica estava, quando se iniciou a pré-época, a um ligeiro passo da força competitiva do F.C.Porto. Deu um gigantesco passo atrás, na sequência de um autêntico suicídio desportivo que fez sair do clube jogadores como Miccoli, Simão, Karagounis, Anderson, Manuel Fernandes, Derlei etc., e depois deles, o treinador que tinha idealizado e preparado a temporada segundo o seu modelo, e tinha arquitectado o plantel de acordo com o mesmo. Agora vai ter de cumprir uma nova caminhada de reaproximação, que vai demorar tempo. Muito tempo.
É necessário que os adeptos não abandonem a equipa quando ela deles mais precisa. A meia casa de ontem, num jogo da Champions, deve envergonhar aqueles que, podendo lá estar, não o fizeram. Diz-se que o Benfica tem seis milhões de adeptos. Para que servem ? Mas isto daria para outro texto, eventualmente ainda maior.
Por mim saberei esperar. Assim como nunca ninguém aqui leu uma letra contra Fernando Santos, também dificilmente o fará relativamente a Camacho, e muito menos aos jogadores. Como diria J.F.K., é altura de os benfiquistas se questionarem, não sobre o que o Benfica pode fazer por eles, mas sim sobre o que eles podem fazer pelo Benfica. Para começar era interessante irem à Luz.
Na vitória ou na derrota, permitam-me que, mesmo com a goela amarga, solte um fervoroso (e paciente) grito:
Viva o Benfica !

5 comentários:

Anónimo disse...

É bom que no meio dos blogs identificados com o SLB apareça alguém com bom senso e mostre que a situação actual do Benfica não é fruto do acaso. Quando se vive de populismo e de mau planeamento/gestão desportiva só dá nisto, entrámos no início de um novo ciclo, demorado ou não depende da paciência dos adeptos e dirigentes.
FS

LF disse...

Eu penso que por tudo o que já passaram nas últimas décadas, os benfiquistas vão tendo obrigação de perceber o que está mal, e porque está mal.

Anónimo disse...

LF

Penso, que o jogo podia ter dado para o nosso lado, aquela bola á barra do Di Maria, poderia ter mudado o rumo do jogo

Os jogadores do Benfica ficavam mais serenos e tudo podia correr melhor, depois os Ucranianos, marcam aos 42 minutos, sem tempo para reações antes do intervalo

Na 2ª parte o Benfica entrou ainda mais nervoso e com a natural ansiedade de ter de marcar 2 golos para ganhar o jogo

É um facto, que a nossa equipa está desarticulada nos seus blocos, não há compensações e a sua dinamica, trás poucos beneficios á equipa

Falta muito trabalho, mas penso que este lote de jogadores, podem formar uma boa equipa, quando será ?

Não sei, se vai ser necessario muito tempo ou não, temos de esperar pelo golo, que Camacho fala e ver o que vai mudar no Benfica

Anónimo disse...

If já passámos por muita coisa mas parece que actual direcção não aprendeu com os erros passados, quando se apoia na emoção(populismo) vs razão dá nisto, não saímos do círculo e como não saímos é fácil de ver onde isto vai parar: O treinador vai ser responsabilizado pelos maus resultados, faz-se mais umas contratações promete-se um futuro risonho e...
FS

Anónimo disse...

O Benfica tem muitos jogadores novos e é sempre complicado criar, rotinas de jogo de forma a que se façam bons resultados. Espero ainda ver o Benfica este ano praticar bom futebol.
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