O MAU DA FITA
Quando José Veiga chegou ao Benfica, ninguém suspeitaria que pouco tempo depois se viesse a tornar numa peça tão delicada e imprescindível da máquina encarnada.
Dele se sabia ser sócio do F.C.Porto, ter recebido um “Dragão de Ouro”, ter sido presidente da Casa do F.C.Porto no Luxemburgo, amigo próximo de Pinto da Costa, ter festejado com champanhe a derrota do Benfica na última final da Taça dos Campeões em que esteve presente frente ao Milan, ter desviado Paulo Sousa do clube da Luz para Alvalade, onde viria a colocar também Mário Jardel na altura em que o brasileiro ainda valia títulos. Digamos eufemisticamente que, para cartão de visita não se apresentava lá muito bem servido, sendo obviamente com grande desconfiança que os benfiquistas o olharam desde logo, desconfiança essa que, na verdade, nunca se chegou a dissipar.
Já com esta sua cara de cristão-novo, muitas foram também as atitudes de pouca cortesia que deixaram os mais pudicos indignados. A última das quais foi aquele irreflectido e pouco educado gesto feito no banco do estádio do Dragão, pois por muito que tenha ouvido, nada justificaria, sobretudo num interveniente no jogo com as responsabilidades de Veiga, a eles reagir.
Estes e aqueles aspectos fazem de José Veiga uma figura profundamente antipática, oscilando a sua avaliação entre o detestável (para ao adversários) e o tolerável (para os benfiquistas mais alinhados), que nem mesmo com os seus constantes e acesos ataques ao F.C.Porto e a Jorge Nuno Pinto da Costa, lhe conseguem achar muita graça.
Poucos adeptos do futebol gostarão dele. Eu não fujo à regra, e confesso que não era bem o tipo de pessoa que eu gostaria de ter como visita de casa.
Só que nada disto é relevante quando se analisa friamente o seu desempenho profissional à frente do futebol encarnado.
José Veiga, exercendo as funções de director-geral da SAD encarnada tem feito um excelente trabalho.
Jogadores, técnicos e demais profissionais – afinal de contas quem com ele trabalha diariamente – estão-se nas tintas para o facto de ele ter sido portista ou outra qualquer coisa. Simão Sabrosa fez-se jogador no Sporting, Nuno Gomes tinha como ídolo de infância o avançado portista Fernando…Gomes, Ricardo Rocha era portista, Nuno Assis sportinguista, Fernando Santos (tal como por exemplo Rodolfo Moura) trabalhou nas Antas e em Alvalade, João Moutinho, Nani, Vítor Baía, Hélder Postiga, Paulo Bento e Jesualdo Ferreira eram todos benfiquistas de pequenos servindo agora os rivais, o que prova que o profissionalismo é algo que nada tem que ver com simpatias clubistas de infância, nem com elas interferem quando chega a hora de fazer do futebol uma vida bem ou mal sucedida. Pensando bem, assim aconteceria também com qualquer um de nós, simples adeptos, se estivessem em causa rendimentos mensais de muitos milhares de euros, e deles dependesse o nosso bem estar e o futuro da nossa família.
Veiga é um profissional do qual se diz ser o primeiro a chegar e o último a partir, que dorme não mais de cinco horas, passando dia e noite a trabalhar para o Benfica – chega mesmo a dirigir-se para o estádio de madrugada no regresso de viagens internacionais para preparar o dia seguinte -, que está sempre próximo de jogadores e técnicos, sendo para eles um verdadeiro anjo da guarda – não esqueçamos que enquanto agente representava Moreira, Quim, Ricardo Rocha, Petit, Nuno Gomes e Simão entre outros -, que revela uma inesgotável capacidade de solucionar todos os aspectos logístico-organizativos em redor da equipa, libertando-a para fazer somente aquilo que sabe – jogar futebol –, que tem um aprimorado conhecimento dos mercados internacionais, uma enorme capacidade negocial e uma rede de contactos ao mais alto nível com muitos dos maiores clubes europeus e, “last but not least”, que é uma figura cuja autoridade ninguém contesta no balneário, sabendo fazer respeitar com rigor e sem concessões todas as alíneas de uma conduta profissional e disciplinar a que um grupo de futebolistas de topo está obrigado (por exemplo ao grego Fyssas, que reagiu mal à sua substituição na final da taça de 2005, terá dito de imediato para guardar bem a camisola pois nunca mais vestiria nenhuma igual).
Para além destes aspectos, julgo que qualquer observador desapaixonado lhe fará a justiça de o considerar um homem corajoso na defesa do Benfica, assumindo de frente e sem rodeios a causa do clube que lhe paga, sempre que este, ou algum elemento seu, se vê de alguma forma atacado (seja por fora ou mesmo por dentro, como também já sucedeu).
Assim se entendem os rasgados elogios que os ex-treinadores Trappatoni e Koeman, bem como muitos dos principais jogadores lhe têm feito. Assim se entende também como será difícil a Luís Filipe Vieira (a quem Veiga tem poupado muito trabalho pesado) encontrar alguém com este perfil profissional no nosso país.
Não deixando saudades entre os adeptos, a ausência de José Veiga vai provavelmente fazer-se sentir na estrutura do futebol benfiquista, o que, numa fase decisiva da temporada, não pode deixar de ser visto com algum pessimismo por quem procure avaliar friamente o problema.
Se pelo contrário, o nosso entendimento privilegiar o lado lúdico-romantico do futebol, por vezes pouco compatível com as vitórias que tanto nos fazem felizes, então soltemos um sonoro: que se lixe !
Herói ou vilão ? A história não vai ficar por aqui. Caso os problemas que o afectam sejam mais graves do que agora se supõe, Veiga poderá ter a sua carreira profissional comprometida. Caso contrário, poderemos tê-lo no Benfica dentro de muito pouco tempo, regressado em ombros de forma apoteótica.
Esperemos então pelos próximos episódios, na certeza de que Veiga, mau grado os problemas que enfrenta, está a conseguir o milagre de sair deste caso com a sua imagem fortemente reforçada junto dos benfiquistas.
Se isso é bom ou mau, o futuro o dirá.
1 comentário:
Sinceramente, fui daqueles que vi a entrada de José Veiga no Benfica com maus olhos. Após (pouco tempo, diga-se) constatei que Veiga estava a fazer um excelente trabalho. Não vou repetir os méritos que tu tão bem descreveste, desde o conhecimento dos mercados, passando pela capacidade negocial, mas sobretudo pelo facto de ter posto fim à "bandalheira" a que o clube esteve sujeito durante uma década...
Não posso deixar de me indignar com o facto de grande parte dos benfiquistas -quiçá a maioria - manifestar-se agradada com a saída de Veiga do Benfica. Para mim isso é um sinal inquívoco de pouca clarividência por parte dessas pessoas, que continuam a olhar para o futebol e para o clube com um desfasamento temporal de muitos anos!
Que me interessa se Veiga ou outro qualquer que sirva o meu clube é benfiquista desde pequenino, ou não!! Benfiquista sou eu, e para mim, o clube estará sempre à frente das pessoas que o servem, serviram ou servirão - estes vêm e vão, o clube fica.
Vi o clube durante a década "horribilis" ser muito mal servido por ilustres "benfiquistas",relembro António Simões - primeiro jogador do Benfica a pôr o clube em tribunal - , que ainda agora teve uma triste intervenção a propósito deste caso da demissão de Veiga, e que deixou muito a desejar enquanto dirigente...
Espero que Veiga resolva os seus problemas rapidamente, pois tenho a certeza que ele fará muita falta, contudo não acredito nisso, está à vista que isso não será fácil. E até nisso, é preciso destacar a postura e atitude exemplar dele, pois, teria sido muito mais conveniente ter o "escudo" Benfica para agora poder enfrentar a "chuva" de problemas que se lhe deparam, no entanto, preferiu - salvaguardando o clube - ir para esta guerra - que é exclusivamente sua - sozinho!
Outros não o fariam como todos sabemos.
Saudações benfiquistas
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