JOGOS PARA A ETERNIDADE (13) - Juventude de Évora - Estoril / 1981

Nem só de grandes jogos nacionais ou internacionais vive a memória dos adeptos. Por vezes foi mesmo na nossa região, na nossa terra, ou mesmo no nosso bairro que se disputou aquele ou aqueles jogos que mais fortemente nos marcaram, e que parecem querer viver para sempre na nossa lembrança. Um desses casos, que marcou profundamente a minha infância, foi sem sombra de dúvida um célebre Juventude de Évora-Estoril, disputado em Maio de 1981, e que, na última jornada do campeonato, perante um estádio a abarrotar, decidia a subida à primeira divisão. Creio que nenhum adepto do futebol em Évora alguma vez se esqueceu dessa soalheira tarde de domingo. Neste período, o clube eborense era uma das mais fortes formações da segunda divisão nacional e, ano após ano, era dado como crónico candidato à subida. Em 1977-78, classificara-se em segundo lugar atrás do Portimonense e, na liguilha subsequente – competição que na altura se disputava entre os três segundos classificados das três zonas, para apurar a quarta equipa a subir -, ficara a apenas um minuto da glória, ao perder em Viseu com um estranho golo marcado à beira do apito final. No ano seguinte, chegou novamente ao segundo lugar (atrás do Portimonense), e na liguilha disputou nova verdadeira final, desta vez em Vila do Conde, na qual nem um penálti falhado faltou, e onde uma vez mais não foi feliz, acabando por perder por 1-0.Depois de uma discreta temporada de 1979-80, o Juventude voltou a viver grandes momentos em 1980-81, ficando novamente, e pela terceira vez em quatro anos, a um pequeno passo de chegar ao escalão máximo do nosso futebol. E se nas épocas atrás referidas as hipóteses de subida se colocaram fundamentalmente na liguilha, e em jogos disputados a norte, nesta ocasião, a equipa azul e branca chegou à última jornada da fase regular com a subida nas suas mãos e a decidir em sua casa. Orientado pelo conhecido Dinis Vital – figura histórica do futebol alentejano -, e presidido pelo actual presidente Amadeu Martinho, o clube eborense conseguiu congregar uma equipa bastante jovem e combativa, como que fazendo jus ao seu lema “Força de Vontade”. Saíram nessa temporada do plantel Guerra, Fernando Sousa, Pedro Paulo, Pinto, Ferro, Arnaldo José, Artur, Santos e Galhofas. Foram contratados o guardião Peres (ex-Beira Mar), os centrais Sabú e José Carlos (ambos ex-V.Setúbal), os médios Quim (ex-V.Setúbal), Fernando e Carvalho (ambos ex-Lusitano) e o experiente avançado Coentro Faria (ex-Barreirense, V.Setúbal e Montijo). Mantinham-se no clube as referências Simplício, Ricardo, Modas, Lelo e Gomes (todos eles eborenses), e ainda o goleador Bolota e o avançado brasileiro Edvaldo, chegados ao clube na época anterior.
O princípio de temporada não foi bom, e à quarta jornada o Juventude estava abaixo da linha de água com três derrotas consecutivas. No final da primeira volta contudo, mesmo com o peso de cinco derrotas e quatro empates em quinze jogos, a equipa já fora capaz de recuperar até ao sétimo lugar. Na segunda volta, o Juventude explodiu então para uma das mais entusiasmantes temporadas da sua longa história. Com onze vitórias em treze jogos - série apenas interrompida por uma derrota no Campo Estrela diante do eterno rival por 1-0 e um empate em Beja -, triunfando em terrenos difíceis como Faro (0-1 ao Farense com golo de José Fernandes), Cova da Piedade, Oriental, Odivelas ou Montijo, quase sempre de forma tangencial (onze vitórias tangenciais no campeonato), a equipa azul e branca foi trepando lugares na classificação, e a quatro jornadas do fim era já segundo classificado a dois pontos do líder Estoril-Praia. Na antepenúltima jornada, os eborenses venceram em casa o Vasco da Gama de Sines por 3-2, enquanto o Estoril derrapava, perdendo o seu jogo e deixando-se igualar no topo da tabela. A equipa estorilista beneficiava contudo da vitória por 1-0 sobre o Juventude na última jornada da primeira volta, mas…ainda tinha de jogar em Évora. Na jornada seguinte o Estoril ganhou, mas o Juventude não foi capaz de pontuar no Estádio dos Barreiros diante do Nacional, perdendo por 2-0, num jogo que, com a equipa já envolvida até ao pescoço na luta pela subida, fez juntar uma pequena multidão junto da sede do clube para ouvir o relato. Mas nada estava perdido. Na última jornada, com dois pontos a separá-los, jogava-se na Cidade Museu um Juventude-Estoril ! Em caso de vitória por dois ou mais golos de diferença, o Juventude igualava o adversário e ganhava vantagem no confronto directo, subindo assim de forma directa, à primeira divisão. Qualquer outro resultado garantia a subida aos estorilistas, remetendo a equipa alentejana para a liguilha de promoção. Não me recordo de ver tão grande enchente no Sanches de Miranda, e só a presença da selecção em Évora, antes do último Mundial, terá trazido tanta gente ao futebol na cidade nos últimos quarenta anos. Foi erguida uma bancada suplementar, e foi precisamente nela que me sentei. Tinha onze anos, e as emoções eram muitas e muito fortes. Nessa tórrida tarde , o Juventude alinhou com Peres, Simplício, José Carlos, Ricardo, Modas, Lelo, Quim, Fernando, Edvaldo, Coentro Faria e Bolota. Viriam a entrar depois Carvalho e José Fernandes. O Estoril-Praia, orientado por Ruas (guarda-redes suplente), apresentava uma equipa tremendamente experiente e à base da que jogara a temporada anterior (e jogaria na seguinte) na primeira divisão: Manuel Abrantes, Teixeirinha (ex-F.C.Porto), Paris, Ernesto, José António (futuro internacional do Belenenses já falecido), Paris, Manaca (ex-Sporting e V.Guimarães), Salvado, Jerónimo (ex-juventudista), José Abrantes e Diamantino (ex-titular do Benfica, no início dos anos setenta). Na segunda parte entrou Fernando Santos (esse mesmo, o  actual treinador)

Depois de uma primeira parte equilibrada, e quando já se estava à beira do intervalo, Coentro Faria conseguiu uma recarga vitoriosa a um remate de meia distância, atirando para o fundo da baliza de Manuel Abrantes. Foi o delírio no estádio, com uma mini-invasão de adeptos eufóricos com um golo em tão importante momento. 

Durante o intervalo a esperança tomou conta do estádio e da cidade. Mas logo aos cinco minutos do segundo tempo, José Abrantes desviou ao primeiro poste um cruzamento de Diamantino, e bateu Peres, restabelecendo a igualdade, e complicando as contas da equipa juventudista. O Juventude sentiu muito este golo, e não mais voltou a ser a equipa acutilante que fora até então. Veio ao de cima a experiência do Estoril, e a dez minutos dos noventa, de novo José Abrantes, em lance individual, acabou com o jogo e com a ilusão dos da casa. 1-2 foi o resultado final, com a invasão final a ser agora dos muitos adeptos que acompanharam o Estoril, e no relvado fizeram a festa de uma subida que deixou Évora banhada em lágrimas. Embora não fosse a primeira vez que o clube eborense estava próximo da primeira divisão, o facto de o jogo se disputar em Évora, de ser uma última jornada, e até pela carreira crescente da equipa tornou esta partida verdadeiramente lendária. Foi sem dúvida um momento para a história do clube, seguramente um dos mais amargos, mas inegavelmente um dos que mais alto fez soar o nome do clube. 


Desse jogo ficou também a polémica em torno de Coentro Faria que, à data desta decisiva partida, estaria já comprometido com o Estoril, onde jogou no ano seguinte. O ponta-de-lança, que marcara quinze golos no campeonato (mais sete que Bolota, o segundo melhor marcador da equipa) foi então acusado de falta de zelo contra a sua futura equipa, contribuindo assim para a derrota. Acusações sem qualquer sentido, até porque, para além do golo do Juventude ter sido marcado justamente por Coentro Faria. Coentro Faria, anos mais tarde, em duas diferentes ocasiões, viria a treinar a equipa eborense, mas sócios houve que nunca se esqueceram dessa polémica. Ainda recordo a emissão de um resumo da partida, com reportagem da festa estorilista, no telejornal do dia seguinte. Dia de grande e profunda decepção, mas de renovado fervor clubista, como em mim as grandes derrotas sempre tiveram condão de fazer recrudescer. Na liguilha, duas derrotas em casa com Académico de Viseu e Nazarenos, deixaram o Juventude fora da corrida. Apesar de na época seguinte chegar a andar algumas jornadas no comando da classificação, nunca mais o clube voltaria a estar perto de disputar o principal campeonato do nosso país.

5 comentários:

Anónimo disse...

LF

Eu também estive nesse jogo, embora sócio de bancada, gostava de ver os jogos atrás da baliza do guarda redes adversário e estar em contacto com toda a azafama das jogadas perigosas, dos cantos e dos livres, sempre em cima do acontecimento

Esse foi o jogo da minha juventude, estádio cheio, emoção, muita emoção, ansiedade e tudo o que trás, este tipo de jogos

Na jornada do Nacional-Juventude, lá estive na velhinha sede do Pátio do Salema, até porque não havia radios locais para dar o relato do jogo e foi uma ligação muito "manhosa" com cortes e tudo..., foi espectacular, outros tempos, que recordo com muita saudade

LF disse...

Grandes recordações.
Ainda tenho uma memória difusa do jogo de Viseu em 1978, e de a minha mãe me ter dado a notícia (errada) da subida do Juventude, que suponho chegou a ser festejada em virtude de um mal entendido. Pelo menos é isso que a minha memória guarda, não sabendo bem se corresponde ou não aos factos.
O Académico de Viseu marcou nos últimos segundos e estragou tudo.

3 anos depois, este jogo com o Estoril já lembro com maior nitidez (até por ter estado no estádio), assim como de alguns dessa temporada.

Seria interessante o Juventude promover um trabalho sobre esses anos (1977-1983), agora que quase todos os interpretes ainda estão de boa saúde para contar a história. Ao fim e ao cabo foram os anos dourados do clube.
E para mim pessoalmente, aqueles que fizeram de mim juventudista.

Anónimo disse...

LF

Nós aqui a falar de recordações do nosso Juventude e ao passar pelo seu Blog oficial, reparei que há uma pergunta, para se votar que me deixou "parvo", pedem para se votar, para se saber, qual a cor do equipamento do Juventude

Em minha opinião, até não desgostava que fosse de outra cor, porque azul com listas em branco, faz-me lembrar um clube que não gosto e que não tenho a minima simpatia

Mas tenho de me aguentar, porque esta é cor, que os fundadores do Juventude escolheram e foi com estes equipamentos que aprendi a gostar e temos de os respeitar

Já no ano passado o Juventude equipava de amarelo, o que eu achava "estupido" e sem cabimento nenhum, mas parece que esta questão é seria demais e podem-me chamar de "velho do Restelo", mas as cores do meu clube, são azul e branco

Foi por estas e por outras, que me afastei, depois de ser sócio durante 24 anos e ter feito o meu dever como sócio, quer em obras, quer na formação e no apoio ao clube, mas esse é o dever de um sócio que vive o clube

Esta pergunta, só tem igual, com este pedido da direcção do Benfica para um concurso para alterar o emblema do S.L.Benfica...,

Inacreditavel, o que faz o dinheiro

LF disse...

Não concordo.

Por um motivo: não me parece bem que o Juventude tenha um equipamento igual a um dos clubes grandes, que ao que sei nunca deu, não dá, nem eu (como sócio) queria que desse, um chavo ao Juventude.

Para não haver confusões, gostava mais de ver o Juventude todo de azul, de amarelo, de branco, com riscas diagonais, às bolinhas, mas nunca igual ao Porto.

Embora respeite a história, é para mim mais importante evitar equívocos. E logo com quem...

De qualquer modo, seja quais forem as cores, nunca deixarei, obviamente, de ser juventudista.

LF disse...

Quanto ao emblema do Benfica, tal já foi desmentido em comunicado da direcção.
De qualquer forma, o que se falava era de pequenos ajustes de tonalidade de cor.