DO DESPERDÍCIO AO SUICÍDIO: A HISTÓRIA DE UMA DERROTA INFELIZ E EVITÁVEL

Dói bastante perder quando fica a sensação de se poder ter feito outro resultado. É este o sentimento predominante em toda a família benfiquista depois de uma comprometedora derrota em Glasgow que, ao longo do jogo, quase sempre pareceu possível evitar.
O Benfica entrou muito bem na partida, realizando quinze minutos a um nível que ainda não tinha demonstrado na corrente temporada. Com uma linha intermediária muito povoada e muito agressiva na conquista da bola, a equipa encarnada instalou-se no meio-campo escocês, dominando claramente o jogo e criando oportunidades flagrantes para marcar. Maxi Pereira parecia ter o dom da ubiquidade, tal a forma como aparecia em todo o lado, Binya mostrava os dentes na luta pela bola, Katsouranis ligava a equipa, Rui Costa soltava toda a sua classe, e Cardozo conseguia aparecer em zonas de finalização, obrigando Boruc a duas intervenções de imensa categoria. O Celtic parecia surpreendido, e demorou algum tempo a reagir a tão confiante e personalizada entrada benfiquista.
É de lamentar que este período não tenha sido coroado com um golo, que poderia ter transformado tudo. Mas o desperdício, numa competição como esta, paga-se caro, e o Benfica desperdiçou muito. Desperdiçou as oportunidades que construiu, e desperdiçou os inúmeros lances de bola parada de que beneficiou (cantos e livres perigosos), e nos quais nem uma única vez soube criar perigo.
Após esse período inicial, a equipa da casa forçou a pressão ao meio campo encarnado, começou a conquistar segundas bolas consecutivamente, deu velocidade ao seu jogo, e virou a agulha da partida para o seu lado, obrigando então Quim a brilhar. Ficou desde logo patente alguma dificuldade do Benfica em fechar o seu castelo defensivo, quer pelos sucessivos erros de posicionamento que ia cometendo, quer por alguma falta de pressão à entrada da sua área – que ficaria bem expressa no golo de McGeady à beira do intervalo. A equipa de Camacho não conseguiu nessa fase – e a bem dizer, ainda não o conseguiu esta época – oferecer uma solidez nas suas linhas mais recuadas capaz de impedir o(s) adversário(s) de criar perigo, à semelhança do que se vê fazer, por exemplo, ao F.C.Porto. Edcarlos e Luís Filipe são dois profissionais esforçados, mas com alguma limitações, quer de posicionamento, quer de intensidade de pressão sobre o adversário e a bola. Binya tem uma generosidade impressionante, mas ainda tem de lapidar muitos aspectos relativos à sua movimentação em campo. E Petit nunca mais regressa. Tudo isto se fez sentir na noite de Glasgow.
Paradoxalmente, foi já quando a pressão escocesa arrefecera, e numa fase mais incaracterística do jogo, que o Celtic chegou à vantagem, com um golo fortuito em que uma malfadada tabela nas costas de Luisão traiu Quim. Estávamos no último minuto antes do intervalo, é sabe-se como é dramático sofrer golos em momentos como esse, para mais de uma forma tão infeliz.
Na segunda parte o Benfica já não foi o mesmo que tinha iniciado a partida. Lutou, tentou, mas sempre mais com o seu infinito coração do que de forma racional e objectiva. O Celtic por seu turno tranquilizou-se, cortou os caminhos para a sua baliza, e foi sempre capaz de pôr em respeito a defensiva encarnada, senão dominando, pelo menos controlando o jogo.
Quando se esperava um assomo final de pressão do Benfica, eis que incompreensivelmente Camacho retirou do jogo aqueles que poderiam fazer a diferença. Ao invés de substituir um pouco feliz Edcarlos, fazendo recuar Katsouranis e intrometendo Nuno Gomes na luta da frente, o técnico espanhol optou por manter uma estrutura defensiva excessiva e desacertada, subtraindo peso e altura ao ataque, e sobretudo, lucidez de passe a meio-campo. Para quem precisava de marcar…
É claro que o cansaço já se fazia sentir, mas nem que fosse pelas bolas paradas (o cântaro tantas vezes vai à fonte…) valia a pena manter aqueles dois elementos, sabendo-se que as alternativas directas a eles pura e simplesmente não existem no plantel. A expulsão de Binya foi a machadada final num jogo que começou em desperdício, e acabou em perfeito suicídio, pela mão de Camacho e pelo pé do belicoso médio camaronês. A derrota consumou-se, e apesar dos belos períodos de futebol que foi capaz de realizar, não se pode dizer com firmeza que o Benfica merecesse outro resultado. Isto apesar da infinita bravura de todos os que pisaram o relvado, mesmo os que estiveram menos felizes, provando que não é por falta de profissionalismo, entrega e brio dos seus jogadores (foram de facto homens !) que o Benfica não está noutra posição.
O árbitro esteve muito bem, cometendo apenas um erro ao não assinalar uma falta clara sobre Rui Costa, perto da área, ainda na primeira parte. A expulsão de Binya foi óbvia - trata-se de um lance típico de cartão vermelho directo, na disputa do jogo e da bola, e nada mais que isso, como já li e ouvi por aí.
Com este resultado, o Benfica agarra-se decididamente à calculadora. Matematicamente a coisa nem está, em tese, assim tão negra: o Benfica “apenas” tem de vencer os seus dois jogos, e se o conseguir dificilmente ficará eliminado – só uma única combinação de resultados, na qual o Celtic vencesse o Shakhtar e empatasse em Milão, deixaria os encarnados de fora. O problema contudo não é de matemática mas sim de futebol, ou seja, dizendo de outro modo, se fosse o Milan a estar na situação pontual do Benfica eu parece-me bem que se apuraria, mas este Benfica não tem futebol, nem para vencer os campeões europeus, nem para triunfar na Ucrânia. Temo até que nem faça mais nenhum ponto. É este o grande e insanável problema dos encarnados, e não adianta muito pensar sequer na Uefa, pois também para ela são necessários (vários) pontos, e vamos dar ao mesmo.
Resta o campeonato – que também não está famoso -, e sobretudo a esperança na construção de uma equipa para o futuro, caso a direcção e o presidente não decidam mais uma vez destruí-la, aplicando em cada defeso os estranhos fundamentos de uma espécie de manual de como-perder-ano após ano-títulos-parecendo-que-se-quer-ganhá-los.

2 comentários:

Anónimo disse...

LF

Grande "barraca" de Camacho, não percebi qual a ideia do treinador espanhol do Benfica, tirar Rui Costa e Cardozo, quando a equipa necessitava de marcar golos, não me entra na cabeça, de maneira nenhuma

Refrescar o ataque ?
Com um jogador que esteve lesionado durante várias semanas, só com 30 m nas pernas, ou com o Bergessio, que passa sempre ao lado dos jogos, não marca golos e não pode ter confiânça ao ponto de virar um jogo, para mim, é falta de inteligência do Camacho

Qual era a ideia dele ?
Ficar com 4 defesas fixos e mais um trinco, quando a equipa necessitava de atacar, para marcar golos

Para quem está sempre a dizer, se não gostarem da sua maneira que ser, pode ir embora para casa, arriscou muito pouco teve medo de que ???, de perder por mais golos, parece-me muito agarrado ao lugar e muito parado, sem arriscar nada

Camacho, já tinha tempo de pôr estes jogadores a jogar mais, aceito, que plantel é demasiado longo e que os jogadores das segundas linhas não são muito bons como os titulares, mas a equipa tinha de jogar mais durante os 90m

Toda a gente percebeu, que Cardozo gosta mais da bola no pé, de perferencia no esquerdo, mas continuam a mandar "charutadas" para a area, para a cabeça de Cardozo, os centrais são tão altos como ele, Cardozo pode fazer a diferença é pelo chão

Esta foi á conta de Camacho

LF disse...

Eu parece-me que ele despreza um pouco os aspectos tácticos, em relação aos aspectos físicos.
Um jogador está cansado, ele tira-o mesmo que a alternativa seja pior.

Mas não dramatizemos. Todos os grandes treinadores cometem erros.