JOGOS PARA A ETERNIDADE (1) - Benfica-Steaua/1988

20 de Abril de 1988, Estádio da Luz - Lisboa.
Havia vinte anos certinhos que o Benfica não chegava a uma final da Taça dos Campeões Europeus. Fora em 1968 que a equipa de José Augusto, Eusébio, Torres, Coluna e Simões perdera em Wembley com o Manchester United por 1-4 no prolongamento de um jogo que teve oportunidade de matar no tempo regulamentar. Muitos ainda se lembravam, outros, como eu, nem sequer eram nascidos na ocasião.
Entretanto a geografia futebolística mudara de rota, com as equipas do centro e norte da Europa, suportadas por uma condição atlética superior, a relegarem os latinos para segundo plano. Só em 1983, com um recém chegado Eriksson, o Benfica dera sinais de poder voltar ao topo do futebol internacional, quando foi finalista da Taça Uefa, vendo o Anderlecht levar-lhe a taça em pleno Estádio da Luz.
Em 1988, depois de um princípio de temporada acidentado, com maus resultados e a consequente substituição de Ebbe Skovdhal por Toni no comando técnico da equipa quando o campeonato nacional estava já perdido, a aposta do clube passou a centrar-se na competição europeia, na qual a equipa se apurara tranquilamente para os quartos-de-final após ultrapassar Partizan de Tirana e Aarhus. Esta prioridade ia também de encontro às promessas eleitorais do novo presidente João Santos.
Nos quartos-de-final deu-se a vingança sobre o Anderlecht (2-0 e 0-1).
O sorteio das meias finais tirou do caminho das águias o Real Madrid e um super PSV Eindhoven onde jogavam vários titulares da selecção holandesa, mas nem por isso se poderiam esperar facilidades. O Benfica ia defrontar o Steaua de Bucareste de George Hagi, então no top do futebol internacional, campeão dois anos antes e finalista na época seguinte.
Na primeira mão em Bucareste (ainda nos tempos de Ceausescu), um Benfica pragmático arrancou uma igualdade a zero que deixava as melhores expectativas para o jogo da Luz.

Quando entrei no estádio, mais de três horas antes do jogo se iniciar (na altura ainda não havia lugares marcados), o panorama era impressionante. Já estariam nessa altura nas bancadas quase 100 mil pessoas. Fiquei numa das primeiras filas da então bancada de sócios, com a vedação pela frente.
Foi o jogo internacional do Benfica com mais assistência de sempre, com um número de espectadores talvez superior a 130 mil. A expectativa era enorme pois o Glorioso poderia ali mesmo, naquela noite, classificar-se para a sua sexta final da Taça dos Campeões.
O Benfica alinhou inicialmente com: Silvino, Veloso, Mozer, Dito, Álvaro, Elzo, Chiquinho, Diamantino, Pacheco, Rui Águas e Magnusson. Depois entrariam Chalana e Shéu. Nos romenos além de Hagi jogavam também os internacionais Lacatus e…Laszlo Boloni.
A entrada dos encarnados foi de rompante, empurrando logo nos primeiros instantes a equipa romena para o seu reduto defensivo.
Cerca dos vinte minutos surgiu o primeiro golo. Na sequência de um canto houve um desvio na área e Rui Águas surgiu ao segundo poste a cabecear para a baliza. Foi o delírio num estádio totalmente pintado de vermelho.
Pouco depois da meia hora de jogo, um livre na meia esquerda apontado por Diamantino fez a bola sobrevoar a área romena, onde novamente Rui Águas com uma impulsão notável a desviou pela segunda vez para o fundo das redes. Dois a zero era um resultado que dava outras garantias para o que faltava de jogo e o público sentiu isso criando então um clima de festa que duraria até final e que resistiu ao momento em que Lacatus fez a bola embater no poste da baliza de Silvino.
Na segunda parte as melhores oportunidades voltaram a ser do Benfica, designadamente numa jogada individual de Elzo em que o brasileiro se isolou perante o guardião romeno, não conseguindo no entanto dar a melhor conclusão ao lance.
Os últimos minutos foram de loucura generalizada, com dezenas de milhares de bandeiras e cachecóis, um barulho ensurdecedor, e pessoas a saltar abraçadas umas às outras pelas bancadas.
À saída a minha memória retém algo irrepetível. A segunda circular tomada por adeptos eufóricos, comemorando com garrafas de tudo e mais alguma coisa, interrompendo totalmente o trânsito, pessoas abraçadas estendidas pelo chão, pessoas em cima dos carros etc., tudo num clima de uma euforia absolutamente indescritível e para o qual não encontro palavras adequadas.
O Benfica perderia a final no desempate por grandes penalidades frente ao PSV, momento que representa ainda hoje a maior frustração desportiva da minha vida de benfiquista. Mas por esta meia final até isso valeu a pena.
Este foi o jogo da minha vida durante algum tempo. Outros se seguiriam.

FOTOS: slbenficaimagensretro.blogsport.com

12 comentários:

cj disse...

vi essa final, em Évora, numa sala improvisada na praça do giraldo, cheia de gente.

Anónimo disse...

Foi uma meia-final.

Anónimo disse...

eu estou a falar do jogo com o psv...
obviamente...

Anónimo disse...

Ah.
Esse vi-o em casa.
Lembro-me do sofrimento dos penaltis, de andar de pé à roda da sala quase sem conseguir olhar para o televisor, e da indescritivel frustração final.

Foi o maior desgosto que o futebol me deu em toda a vida.
Ver a máxima glória ali tão perto...

Resta-me o consolo de de então para cá nunca mais ter visto o Benfica ou a selecção perder um desempate por penaltis.
Já vão umas seis vitórias seguidas, que me lembre.

Anónimo disse...

Passados alguns anos até tive um sonho com esse jogo:
Final Benfica-PSV em Estugarda, só que no sonho Dito (não me perguntes porquê ele) marcava o golo da vitória a poucos minutos do final do prolongamento, o Benfica levantava a taça e eu ajoelhado no chão da sala com as lágrimas nos olhos de ver o Benfica campeão europeu.
Depois acordei...

Anónimo disse...

é o que acontece aos benfiquistas...quando acordam vivem o pesadelo.
os sonhos eram antigamente, quando o eusébio ainda jogava...

Anónimo disse...

:)
Olha que os sonhos por vezes antecipam as realidades.

Há dois anos também sonhei que o Bnefica seria campeão, na última jornada, no Estádio do Bessa, comigo a assitir num dos topos e o Luisão a marcar de cabeça o golo da vitória no outro topo, nos últimos minutos de jogo.

Compara com a realidade.
A unica diferença foi que o golo do Luisão nos últimos minutos foi na jornada anterior frente ao Sporting, estando eu também no outro topo.

Portanto ;)

cj disse...

estás a falar da irregularidade que deu origem à conquista do campeonato comprado pelo benfica?
ah sim, lembro-me disso.

GFAmaral disse...

Talvez seja este o primeiro jog ininterrupto que eu vi na minha vida.
Tenho memórias do Porto - Bayern, de alguns jogos do Mundial do México, e da final da Taça de 87 (Benfica - Sporting). Mas, eu que era um puto com 10 anos mal feitos, vi este meu primeiro jogo ininterrupto dado a que o meu pai (contrariando a minha mãe) me permitiu ficar acordado até tão tarde.
Nunca hei-de esquecer as ténues imagens que tenho dos dois golos do Rui...
O meu segundo jogo ininterrupto foi a final...

Mestre disse...

Estava lá e adorei a descrição. Faltou-te o promenor das bandeiras de papel encarnadas que estavam a dar à porta a todos os que entravam: A festa dos golos e a alegria de voltarmos a uma final foi fantástica.

Para mim, o jogo da minha vida na Luz.

Anónimo disse...

lembro-me desse jogo todinho como se fosse hoje, adormecia a chorar e no dia seguinte tinha uma viagem de estudo a Évora onde fui obrigado pela minha mãe.

Ao ler este posto não deixaram de me vir as lágrimas aos olhos, a vitória esteve quase quase numa jogada do Wando na segunda parte (acho q foi dele). Mas a derrota tinha chegado no fim de semana anterior com a lesao do Diamantino pelo Adão (do V. Guimarães).

Forte abraço a todos,
Francisco

Unknown disse...

Eterno