AS LÁGRIMAS AMARGAS DE UM GOLEADOR EM CRISE

A propósito do Benfica-Boavista da passada sexta-feira, referi-me neste espaço às últimas e pobres prestações de Nuno Gomes, que antes de qualquer adepto devem preocupar sobretudo o próprio. Lembrei na altura que o amarantino havia marcado apenas um golo nos últimos dez jogos que realizou para o campeonato, sempre como titular.
O ponta-de-lança do Benfica é de facto um caso muito particular no plantel às ordens de Fernando Santos – aliás o plantel encarnado está cheio de casos particulares, como Mantorras e Miccoli por exemplo, o que não deixa de ser motivo de alguma reflexão -, quer pelo seu peso no balneário e pela absoluta titularidade daí resultante, quer pelo rendimento desportivo equívoco - sendo um jogador importante nas acções de ataque da equipa devido à capacidade técnica de que inegavelmente dispõe, mas que revela frequentemente uma preocupante inoperância junto das balizas adversárias, limitando a equipa no seu potencial concretizador.
Olhando ao que conheço de Nuno Gomes como jogador e como figura pública, e observando o percurso que desenvolveu na sua carreira, a ideia que claramente me assalta é a de que Nuno podia ser muito mais “Golos” do que de facto é, e que essa diferença entre a realidade e o potencial se deve mais ao próprio do que a qualquer factor externo.
Há algum tempo atrás estive a visionar uma cassete com gravações de todos os golos da temporada de 1999-2000, a última de Nuno Gomes na sua primeira passagem pela Luz antes de se transferir para Itália. Nesse campeonato anotou 25 golos, não se sagrando melhor marcador apenas porque nas Antas morava um senhor chamado Mário Jardel, então no auge da sua carreira de grande goleador. Nuno Gomes havia marcado nas temporadas anteriores 18 e 21 golos respectivamente, nas quais recordo por exemplo um jogo a que assisti à chuva no antigo estádio em que ele marcou 4 golos ao Varzim, outro em que também sob o meu olhar virou um resultado com o Belenenses de 0-1 para 2-1 com dois golões já perto do final, ou outro ainda em que anotou 5 golos ao Leça. No Europeu de 2000 Nuno fez aquilo que todos se lembram, sagrando-se um dos melhores marcadores da prova com golos para todos os gostos.
Quem tenha a possibilidade de rever esses momentos ficará quase chocado com a impressionante diferença entre esse Nuno Gomes e o de hoje. Um ponta-de-lança rápido, incisivo, forte na disputa de bola e prático no remate, deu lugar a um avançado aburguesado, tecnicista mas ineficaz, fugindo ao choque, perdendo todos os lances divididos, revelando alguma mobilidade mas que por vezes mais não é do que uma fuga ao local onde deveria travar os seus combates: a área.
Li nos últimos dias um artigo de Paulo Sousa acerca das cargas físicas com que os preparadores físicos italianos “agrediam” os jogadores, fazendo-os terminar precocemente algumas carreiras. Lembro-me de facto de alguns casos, entre os quais o do próprio Paulo Sousa, de jogadores cuja passagem por Itália pareceu sugar todos os recursos físicos, deixando-os ao fim de pouco tempo esgotados e frequentemente lesionados, quase sempre pouco depois de serem vendidos para outros campeonatos. A Juventus era um caso paradigmático, liquidando o futuro de jogadores como Vialli, Baggio, Vieri, Ravanelli que assim que de lá saíram, embora ainda relativamente jovens, não mais mostravam as mesmas capacidades. Doping ? É possível, pois também a esse nível houve suspeitas em Itália, levantadas por um antigo treinador checo da Roma, entretanto proscrito.
Não sei se Nuno Gomes terá sido também vítima desta “Síndrome do Cálcio”, mas a avaliar pela carreira de Rui Costa, que o acompanhou ao longo de todo o seu período na lindíssima cidade de Florença, não parece ser o caso.
O que se passa então com Nuno Gomes ?
Como se recordam, o jogador regressou a Portugal e ao Benfica a “custo zero”. As aspas estão aqui muito bem colocadas pois como também sabemos normalmente ninguém dá nada a ninguém, sobretudo tratando-se de futebol profissional. Nuno Gomes recebeu ele próprio diluído pelo seu salário mensal, o valor correspondente à sua transferência, tornando-se num dos jogadores mais bem pagos no nosso país com um vencimento na casa dos 130 mil euros. Ainda hoje julgo ser ele quem aufere o salário mais elevado em todo o plantel benfiquista, talvez em pé de igualdade com Simão Sabrosa, que entretanto viu o seu contrato renovado. Há bem pouco tempo ganhava quatro (!!!!) vezes mais que Liedson no Sporting.
O último contrato assinado pelo jogador vence-se apenas em 2010, ou seja quando ele estiver com 33 anos de idade. Trata-se na verdade de um contrato vitalício, com uma remuneração principesca, bem ao nível do que se paga noutras Ligas bem mais qualificadas, competitivas e mediáticas.
A pergunta que fica a partir destes dados é: que motivação terá um jogador nestas condições para tentar melhorar o seu rendimento ?


A resposta terá de a encontrar o jogador. Não só nos jogos, mas sobretudo nos treinos e na conduta diária (horários, alimentação, hábitos de vida, vícios) que se exige a um profissional tão bem pago para fazer desporto de alta competição. Terá de procurar também novos desafios, para além do seu benfiquismo, que o estimulem a evoluir, pois tem ainda toda uma estatística à sua frente para compor e abrilhantar – de golos e títulos, ele que apenas ganhou uma Liga, três Taças e uma Supertaça em toda a sua carreira - , dispondo depois de muito tempo e dinheiro para ao longo do resto da sua vida poder viver aquilo que lhe tenha entretanto sido negado.
Na época passada Koeman, que tantos erros cometeu, teve a coragem de o deixar no banco num jogo com o Sporting em Alvalade. O Benfica perdeu o jogo, mas na jornada seguinte Nuno Gomes fez um hat-trick ao U.Leiria e poucas semanas depois marcou os dois golos com que o Benfica triunfou no Dragão, só não se vindo a sagrar Bola de Prata devido a uma lesão que lhe roubou as últimas jornadas daquela que terá sido a sua melhor época, sob o ponto de vista individual, desde que regressou à Luz. Que tal Fernando Santos fazer o mesmo, agora que tem Derlei e Miccoli disponíveis ?
Nada me move contra Nuno Gomes. Muito pelo contrário. É um jogador que aprecio e com quem simpatizo bastante desde que chegou à Luz ainda numa fase pós adolescente. É destacadamente o melhor marcador de sempre em jogos presenciados por mim com 45 golos, ou seja, terá sido dos jogadores que mais me fez feliz nos estádios de futebol. É um benfiquista, para além de uma figura de grande simpatia e simplicidade.
Acho todavia que poderia render muito mais, e ele próprio ou alguém por ele tem de o convencer dessa insofismável realidade. Gostaria de ver no Benfica um Nuno Gomes ao nível do Euro 2000, e estou absolutamente convencido de que isso é possível, bastando ele querer. Para um jogador com uma situação financeira tão desafogada como a sua, decerto será muito mais importante a hipótese de figurar a letras de ouro na história do clube, algo que está ao seu alcance, talvez mais do que ao de nenhum outro jogador do Benfica.

Por exemplo, Luís Figo ganhou muito mais dinheiro e títulos que Nuno Gomes e manteve sempre (ainda hoje) um nível de ambição altíssimo. É essa por vezes a diferença entre aqueles que ficam na história e os que apenas constroem uma boa vida.

4 comentários:

  1. Anónimo7.2.07

    LF

    Bom pensamento e ou mesmo tempo pertinente

    Eu penso, que esta falta de golos do Nuno Gomes, deve-se, como o LF referiu, há falta de ambição do jogador, esse estado de espirito, é reflexo da falta de critérios na formação do plantel do Benfica, os avançados eram o Mantorras e o Miccoli, com graves problémas fisicos e o Kikin Fonseca, este a tentar adaptar-se ao estilo de jogo Europeu

    Na táctica do FS ( 4-4-2 ), dois deles eram os titulares, até pelos nomes, Nuno Gomes e Miccoli, os outros não estavam a 100%, por isso não faziam pressão competitiva sobre eles, jogando eles bem ou mal, eram os titulares

    O Nuno Gomes baixou a sua própria exigência e a concentração para a finalização e começou a falhar

    Penso ainda, que no inicio da época, com os problémas do Rui Costa e com as alterações de esquema táctico, obrigaram o Nuno a jogar mais longe da baliza e a descair para as alas retirando-o da grande area e isso tirou-lhe poder de finalização

    O Nuno Gomes podia jogar assim, mas tinha de ter um ponta de lança fixo na area, eu gostaria de ver o Kikin Fonseca a jogar como esse ponta de lança fixo, mas foi vendido e não veio ninguem para o seu lugar, ou com as mesmas caracteristicas

    Mais uma vez julgo que o plantel do Benfica está mal feito e sem equilibrio no ataque, o que leva a uma falta de ambição dos nossos avançados

    Por fim, quero falar da ambição dos guarda redes, que ambição terá o Moreira ou o Moretto para trabalhar, sabendo que não interessa trabalhar bem ou mal para ser suplente do Quim (é á vez) e que o treinador não acredita no seu valor, pois nem na taça podem jogar a titulares e o próprio Quim, que ambição terá, a não ser chegar a titular da Selecção Nacional

    ResponderEliminar
  2. Anónimo7.2.07

    Concordo plenamente.
    De facto não entendo porque é que o Moreira ou o Moretto não têm jogado na Taça.

    ResponderEliminar
  3. Anónimo8.2.07

    Penso que a nossa floribela não marca golos pq não é um ponta de lança puro, aliás o seu jogo de cabeça é até pobresinho (condiçõa essencial para um avançado de área)e que só rende qd tem a seu lado, isso sim, um verdadeiro ponta de lança (o chamado "cameirão"). Lembras-te do B.Dean?
    Não julgo que o ordenado tenha aburguesado o jogador,a questão, em suma, é que o equivoco tem persistido sempre. A floribela só atinge um rendimento elevado e regular quando tem a seu lado outro jogador com carecteristicas diferente e nunca como homem de área, logo o 4-4-2 será o sistema que mais lhe convém e nunca o 4-3-3... Oar fernando santos joga preferencialmente em 4-4-2 em losango, o que em teoria bebeficiaria a floribela, só que a seu "lado" tem o Simão que não é propriamente um loiro, alto e ...tosco....

    ResponderEliminar
  4. Anónimo9.2.07

    Ou seja, precisa de alguém para fazer o trabalho sujo.
    É um bom ponto de vista, e perfeitamente defensável.
    Todavia, conforme referi, já o vi jogar de forma muito mais rápida, agressiva e incisiva dentro da área do que tem feito ultimamente.
    Será que no Euro 2000 quem o visse não julgaria estar perante um ponta-de-lança puro ?

    Para melhor perceberes onde eu quero chegar, gostava de te recordar um episódio de que não quero falar em público mas que penso tu te lembras (não sei bem se eras tu ou o "C" que estava comigo), passado há cerca de dois anos à porta de um restaurante de que tu muito gostas na Estefânia, tendo o Nuno como protagonista. E mais não digo.

    ResponderEliminar