À imagem daquilo que foi toda a sua presidência, José Eduardo Bettencourt não quis deixar de surpreender por uma última vez, anunciando a demissão de forma inesperada e num momento de pertinência duvidosa.
Embora tratando-se de um homem honesto e bem intencionado, creio que o Sporting não perde muito com a sua saída. Em ano e meio demonstrou uma total inaptidão para o cargo, somando erros atrás de erros, equívocos atrás de equívocos, e precipitações atrás de precipitações.
Podia aqui lembrar alguns casos, como as escolhas de Sá Pinto (e depois de Costinha, intermediada pelo grotesco Salema Garção) para um cargo tão importante como o de director-desportivo; também (embora em menor grau) as de Carlos Carvalhal e Paulo Sérgio, dois treinadores medianos; a venda de João Moutinho a um rival directo e todas as declarações e contradições que a envolveram (de maçã podre a profissional exemplar justamente na véspera do Sporting-FC Porto); a célebre declaração “Paulo Bento forever” rapidamente desmentida; a gestão de dossiers como Izmailov ou Caneira; as declarações contraditórias sobre o fundo de jogadores criado pelo Benfica (primeiro uma vergonha, pouco depois um exemplo); a contratação milionária de Sinama-Pongolle; a manutenção de uma relação cordial com Pinto da Costa mesmo após os insultos revelados nas escutas publicadas no You Tube (perante as quais o Sporting assobiou para o lado), entre muitas outras peripécias – perdoem-me se estou a esquecer alguma importante –, que para além do mais tiveram como pano de fundo resultados desportivos ao nível do pior que a história centenária do clube ofereceu, uma baixa dramática do número de espectadores no estádio (certamente também de associados), perda de patrocínios e todo um clima de degradação competitiva e institucional que não vai deixar saudades aos sportinguistas.
Como aspectos positivos da sua gestão, além das questões ocultas de que os seus pares agora falam, ressalvaria apenas um maior apoio às modalidades, o que valeu ao clube um título nacional de Futsal e um troféu internacional de Andebol.
Bettencourt entrou no Sporting pela porta grande, com mais de 90% dos votos, e muita esperança às suas costas. Começou a desiludir logo de imediato, tentando mostrar-se como aquilo que não era: um dirigente popular. Ainda por estes dias pudemos rever imagens televisivas mostrando-o aos saltos e aos gritos num qualquer núcleo sportinguista, imagens essas que eu classificaria de penosas. Quem confunde popularidade com parolice está a chamar parolo ao povo, e creio que foi isso que Bettencourt fez, perdendo toda a autenticidade que deve nortear a vida dos homens, e sobretudo dos homens-públicos. O facto de ser o primeiro presidente remunerado da história do Sporting (e, ao que parece, bem remunerado) também não o ajudou a unir o clube em seu redor, deixando no ar uma imagem de oportunismo, que creio não ser justa, mas que prevaleceu junto de alguns quadrantes.
Bettencourt deixa o Sporting numa situação bastante mais difícil do que aquela que encontrou, e agora contam-se espingardas para o combate eleitoral que certamente se avizinha – isto partindo do princípio que não irão cometer a loucura de designar um presidente sem o aval dos sócios.
Não me peçam para ser eu a escolher, mas fazendo o difícil exercício mental de me imaginar sportinguista, julgo que esta seria a altura de mudar de rumo, e varrer com o que resta de um projecto que manifestamente falhou (o projecto-Roquette). O mundo do futebol tem particularidades muito próprias, e não pode ser gerido como uma qualquer empresa de um ramo comum. O clube necessita que surja um sportinguista credível, com capacidade de se movimentar junto dos financiadores, mas que entenda minimamente o fenómeno futebolístico, e saiba rodear-se de pessoas competentes e experientes. Necessita de algum arrojo para construir uma equipa competitiva, e com ela inverter o ciclo de perda de adeptos e de receitas. Necessita de investir na contratação de um treinador de top (eventualmente estrangeiro), que a médio prazo (dois ou três anos) possa refundar o futebol sportinguista, e dotá-lo de uma nova identidade. Necessita de reavaliar os resultados da política de formação intensiva, cujos reflexos na equipa principal nunca se traduziram (e dificilmente alguma vez se traduzirão) em títulos.
Espero ainda que este caminho contemple um maior entendimento geo-estratégico dos problemas do futebol português, e faça o Sporting assumir-se de corpo inteiro, e sem hesitações, como opositor àqueles que têm atropelado a verdade desportiva nos últimos trinta anos.
Existirá alguém com perfil capaz de interpretar estas soluções? É este o desafio que o Sporting tem pela frente. Eu, cá por mim, vou dormindo descansado.
Embora tratando-se de um homem honesto e bem intencionado, creio que o Sporting não perde muito com a sua saída. Em ano e meio demonstrou uma total inaptidão para o cargo, somando erros atrás de erros, equívocos atrás de equívocos, e precipitações atrás de precipitações.
Podia aqui lembrar alguns casos, como as escolhas de Sá Pinto (e depois de Costinha, intermediada pelo grotesco Salema Garção) para um cargo tão importante como o de director-desportivo; também (embora em menor grau) as de Carlos Carvalhal e Paulo Sérgio, dois treinadores medianos; a venda de João Moutinho a um rival directo e todas as declarações e contradições que a envolveram (de maçã podre a profissional exemplar justamente na véspera do Sporting-FC Porto); a célebre declaração “Paulo Bento forever” rapidamente desmentida; a gestão de dossiers como Izmailov ou Caneira; as declarações contraditórias sobre o fundo de jogadores criado pelo Benfica (primeiro uma vergonha, pouco depois um exemplo); a contratação milionária de Sinama-Pongolle; a manutenção de uma relação cordial com Pinto da Costa mesmo após os insultos revelados nas escutas publicadas no You Tube (perante as quais o Sporting assobiou para o lado), entre muitas outras peripécias – perdoem-me se estou a esquecer alguma importante –, que para além do mais tiveram como pano de fundo resultados desportivos ao nível do pior que a história centenária do clube ofereceu, uma baixa dramática do número de espectadores no estádio (certamente também de associados), perda de patrocínios e todo um clima de degradação competitiva e institucional que não vai deixar saudades aos sportinguistas.
Como aspectos positivos da sua gestão, além das questões ocultas de que os seus pares agora falam, ressalvaria apenas um maior apoio às modalidades, o que valeu ao clube um título nacional de Futsal e um troféu internacional de Andebol.
Bettencourt entrou no Sporting pela porta grande, com mais de 90% dos votos, e muita esperança às suas costas. Começou a desiludir logo de imediato, tentando mostrar-se como aquilo que não era: um dirigente popular. Ainda por estes dias pudemos rever imagens televisivas mostrando-o aos saltos e aos gritos num qualquer núcleo sportinguista, imagens essas que eu classificaria de penosas. Quem confunde popularidade com parolice está a chamar parolo ao povo, e creio que foi isso que Bettencourt fez, perdendo toda a autenticidade que deve nortear a vida dos homens, e sobretudo dos homens-públicos. O facto de ser o primeiro presidente remunerado da história do Sporting (e, ao que parece, bem remunerado) também não o ajudou a unir o clube em seu redor, deixando no ar uma imagem de oportunismo, que creio não ser justa, mas que prevaleceu junto de alguns quadrantes.
Bettencourt deixa o Sporting numa situação bastante mais difícil do que aquela que encontrou, e agora contam-se espingardas para o combate eleitoral que certamente se avizinha – isto partindo do princípio que não irão cometer a loucura de designar um presidente sem o aval dos sócios.
Não me peçam para ser eu a escolher, mas fazendo o difícil exercício mental de me imaginar sportinguista, julgo que esta seria a altura de mudar de rumo, e varrer com o que resta de um projecto que manifestamente falhou (o projecto-Roquette). O mundo do futebol tem particularidades muito próprias, e não pode ser gerido como uma qualquer empresa de um ramo comum. O clube necessita que surja um sportinguista credível, com capacidade de se movimentar junto dos financiadores, mas que entenda minimamente o fenómeno futebolístico, e saiba rodear-se de pessoas competentes e experientes. Necessita de algum arrojo para construir uma equipa competitiva, e com ela inverter o ciclo de perda de adeptos e de receitas. Necessita de investir na contratação de um treinador de top (eventualmente estrangeiro), que a médio prazo (dois ou três anos) possa refundar o futebol sportinguista, e dotá-lo de uma nova identidade. Necessita de reavaliar os resultados da política de formação intensiva, cujos reflexos na equipa principal nunca se traduziram (e dificilmente alguma vez se traduzirão) em títulos.
Espero ainda que este caminho contemple um maior entendimento geo-estratégico dos problemas do futebol português, e faça o Sporting assumir-se de corpo inteiro, e sem hesitações, como opositor àqueles que têm atropelado a verdade desportiva nos últimos trinta anos.
Existirá alguém com perfil capaz de interpretar estas soluções? É este o desafio que o Sporting tem pela frente. Eu, cá por mim, vou dormindo descansado.
Muito bom!
ResponderEliminarSerá que existem sportinguistas com esta clarividência?
Eu prefiro um sporting forte (ou pelo menos melhor do que a anedota em que se tornaram), mas até lá... olha, vou dormindo descansado!
Excelente texto sobre o momento dos nossos rivais.
ResponderEliminarParabéns!
Viva o Benfica!
Epá que se lixem esses gajos, mas que merda até parece que os gajos são do Benfica, eles que se f***m...
ResponderEliminarJosé, eles que se f***m, não é?
ResponderEliminarE já agora que deixem os corruptos ficar impunes a toda a trafulhice que fazem há décadas.
E que deixem os melhores jogadores para eles.
E que alimentem o ruído da opinião pública contra o SLB, quando somos prejudicados como temos sido este ano.
Por mim prefiro uma liga a 3, mesmo que sejam 2 contra 1 como se tem verificado.
Se o José prefere uma liga a 2, é só uma diferença de opinião, tudo bem!
Julgo que todos os casos por ti enumerados, demonstram bem o nervosismo com que geriu o clube e no fundo, foi essa sucessão de acontecimentos que gerou discórdia, com o resultado que conhecemos.
ResponderEliminarExcelente texto, embora na minha opinião a crise do Sporting se resuma a apenas uma coisa: o Benfica. Enquanto o Benfica andou sem rumo e a mudar de treinador todos os anos, tudo parecia correr bem em Alvalade. Na época que antecedeu as eleições em que Bettencourt foi eleito com 90% dos votos, o Sporting não ganhou nada, com a agravante da derrota por 12-1 com o Bayern, mas como ficou à frente do Benfica no campeonato, o saldo da época foi positivo, segundo a grande maioria dos adeptos sportinguistas. Antes das eleições, Bettencourt prometeu "continuidade do trabalho das últimas épocas" e os sportinguistas aderiam e deram-lhe a tal vitória esmagadora. Se repararmos, nada mudou no Sporting desde então: a equipa continua sem capacidade para lutar pelo título e sem ganhar nada. A única diferença é que o factor decisivo para as épocas correrem bem ao Sporting (ficar à frente do Benfica) não aconteceu o ano passado e parece cada vez mais difícil que aconteça este ano. Para mim é esse o problema do Sporting. Não nos podemos esquecer que Paulo Bento logo depois de ter saído, disse que o grande problema do clube era a excelente pré-época e início de época que o Benfica estava a fazer e que havia um "complexo de inferioridade". Não tenho dúvidas que se o Sporting a época passada e nesta estivesse à frente do Benfica, Bettencourt não se tinha demitido.
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